domingo, 7 de abril de 2024

 




O discurso à Cantinflas



Jules Verne quando escreveu o seu  texto A Volta ao Mundo em Oitenta dias, como não existia o cinema na sua época, não poderia prever que 

 o seu livro tornar-se-ia  um clássico do cinema. Estrelado por David Niven, Shirley MacLaine e o insuperável Cantinflas, venceu o Oscar em 1956.


Cantinflas nome artístico do comediante mexicano Mario Moreno, no filme representa Passepartout, o leal parceiro do Philleas Fogg , o aristocrata que apostou fazer a proeza de circundar o mundo em oitenta dias. 


Mario Moreno criou, na sua carreira profissional,  o Cantinflas como  personagem dono de um  discurso prolixo, sem sentido e confuso. O seu discurso de frases inviezadas e atrapalhadas conquistou o público, mas o prejudicou no mercado cinematográfico internacional. Esta figura se tornou na caricatura humorística de todos os prolixos — que falam muito e esclarecem pouco. Caricatura oportuna por abranger a maioria dos discursos humanos.


A prolixidade é alimentada pela confusão das ideias. A síntese, a sua  contrapartida, é fruto das ideias colocadas de forma lógica, ordenada e racional. Uma mente lúcida encontra na simplificação a sua melhor expressão. O bom discurso ou texto é aquele que tem foco, aborda uma ideia única por vez e tem uma sequência racional. Tem começo, meio e fim. Não exige do leitor/ouvinte esforço para apreender do contexto.


Na essência de um bom texto está a simplicidade. Se é complicado ou muito rico de explicações não é um bom texto.  Quantidade de palavras não fazem o conteúdo mais acessível. O discurso à Cantinflas gera muito calor, mas pouca luz. Como em tudo na vida o gênio simplifica e o medíocre complica. Os gênios da humanidade sintetizaram em leis um emaranhado de questionamentos. A lei da gravidade de Newton foi uma delas.

Se a maioria das pessoas aprendessem a colocar as ideias em ordem de forma simples e racional, muitas guerras ( pessoais ou sociais ) seriam evitadas. Falamos, em uma sociedade, a mesma língua, mas chegamos a diversos entendimentos. Há evidentemente uma carga cultural a influenciar a interpretação dos discursos, mas a forma tem um papel preponderante.


Quando Abraham Lincoln dirigia-se para discursar no cemitério de Gettysburg, leu o texto preparado por seus assessores e não gostou. Escreveu no joelho um texto curto, direto, mas denso, que faz parte das antologias dos melhores discursos da história. 


Churchill com a sua retórica insuperável não precisou para motivar os ingleses mais do que suas famosas frases de efeito: “ nunca tantos deveram tanto a tão poucos”; ou “ Só tenho a oferecer sangue, suor e lágrimas”. E os ingleses continuam a apoiá-lo como Primeiro Ministro, sob o bombardeio das bombas voadoras V 2, que destruíam Londres.


O objetivo de um discurso, escrito ou falado,  é transmitir uma mensagem e não encantar os ouvintes com uma verborragia que a par de cansar dilui o conteúdo. Por concisão ou preguiça , fale pouco, escreva textos curtos - mas pense muito para colocar as ideias em ordem, se quiser ser lido e compreendido. Esta constatação  me induz a terminar aqui este discurso   para não “cantinflar”.


São Paulo, 26 de outubro de 2023.

Jorge Wilson Simeira Jacob






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