sexta-feira, 29 de abril de 2022

 Os Jesuítas.


O olhar despreocupado do homem não percebe que a serenidade da superfície das águas de um rio pode estar encobrindo fortes torrentes nas  suas profundezas. Assim como  também não  vê que a aparente normalidade da vida disfarça violentos jogos políticos em curso. Somos todos vítimas das aparências. Exceto os que nadam nas profundezas, nos bastidores. O livro Os Jesuítas - A Sociedade de Jesus e a Traição à Igreja Católica é uma visão de quem sabe das coisas. Malachi Martin, o autor, desvenda os detalhes da luta entre os Jesuítas e o Vaticano. Uma guerra pelo poder entre Papa Branco e Papa Negro.


Autor de  14 livros sobre o Vaticano , um ex-jesuíta, impacta pelo seu conhecimento das pessoas e domínio das informações desse universo. Surpreende pela capacidade de destrinchar os nós do jogo político. Não se deixa levar pelas aparências. Vai às profundidades dos  acontecimentos. Disse o jornal Houston Chronicle em review : “ Este é um livro que você não vai deixar de lado. Não importa se você é Cristão ou Mulçumano, ou o que quer que seja, você descobrirá que a influência do Vaticano pode afetar a sua vida”.


O tema do livro é A Sociedade de Jesus fundada em 1540 por  Inácio de Loyola, com a bênção do Papa Paulo lll, para ser uma milícia a serviço do Papa. Organizada sob princípios militares, ela tinha como chefe supremo o Superior General. Os seus meios de ação iam da catequese até à própria guerra. O seu objetivo era a salvação das almas, não as conquistas deste mundo, a vida material. Seguia a lição de Jesus de deixar a César o que era de César, a Deus o que era de Deus.


Depois de séculos de obediência absoluta à vontade papal, nos anos sessenta um jesuíta peruano, Father Gustavo Gutierrez  ( 1960 ), pública  A Teologia da Libertação, que motivou uma nova missão aos jesuítas. Uma inflexão acontece na Conferência dos Bispos Católicos em Medellín, Colômbia ( 1968 ) , em que um documento foi emitido com uma nova proposta: “ exercitar uma opção preferencial pelos pobres e oprimidos”.  Como é típico da Companhia de Jesus, os jesuítas da  Nicarágua começaram com paixão a trabalhar pelo sucesso do Sandino-Comunismo. Quando estes venceram as eleições, muitos deles não só assumiram postos no governo como se empenharam a propagar uma nova ordem política nos países da região. Os jesuítas participaram no treinamento de guerrilheiros comunistas para implantar a nova concepção da “ opção preferencial pelos pobres”. Simultaneamente, enquanto pregavam  a distribuição da riqueza, os jesuítas no governo da Nicarágua viviam nababescamente nas casas pilhadas dos ricos, frequentando restaurantes e lojas de artigos de luxo de acesso exclusivo para a nova nomenclatura, da qual faziam parte.


Com este movimento a Companhia de Jesus inicia uma ação revolucionária - a modernização da Igreja. Todos os dogmas estão sob crítica: a infalibilidade  e autoridade do Papa, o celibato, a moral sexual em todos os seus aspectos, a crença no sacrifício da missa, a divindade de Jesus, a existência do Inferno,  a Imaculada Concepção da Virgem Maria  e o sacerdócio. Em fato, renegaram todas as crenças consideradas valiosas para viver ou morrer - inclusive a própria natureza e constituição da Igreja que Cristo fundou.



Depois do papado de Pio Xll. ( 1939 / 1958 ), intransigente opositor do  Marxismo e suporte da civilização ocidental, apoiado nos Estados Unidos, é  eleito o Papa João XXlll ( 1958 / 1963), que adotou como estratégia uma política de acomodação. Acreditava que uma política de “ janelas abertas e campos livres” traria os jesuítas à realidade. A sua ideia fracassou. João realisticamente, no final da vida, concluiu que a sua liberalidade foi entendida como fraqueza, o que alimentou a ousadia dos jesuítas marxistas.


Papa Paulo Vl ( 1963 / 1978/) não percebeu a fraqueza da estratégia do antecessor e a refinou.Paulo, no final do seu pontificado, conscientizou-se  que o propósito da Sociedade de Jesus tinha mudado. A Sociedade de Jesus não era mais a mesma fundada por Ignácio de Loyola. Ciente dos inconvenientes desvios para a sobrevivência da Igreja, em 1973 encontra-se com o Superior General da Companhia de Jesus para tentar  alterar o curso dos eventos. Seguiram-se diversas  turbulentas reuniões. Pedro Arrupe, o Superior General fazia parte do projeto de mudança da estratégia da Igreja Católica. Em seu entender, ela não seria mais a Igreja do Senhor , mas a Igreja do Povo. Paulo Vl diante da afronta do Superior General , em mais de uma vez sugeriu que ele renunciasse. O que não aconteceu em seu mandato. Não foi diferente o relacionamento entre Arrupe e o Papa sucessor, João Paulo l,  nos seus trinta e três dias como pontífice. Arrupe era inamovível.


A insubordinação ao papado não é aceita pelo então cardeal de Cracóvia, na Polônia, agora eleito como Papa João Paulo ll ( 16/10/1978 a 02/04/2005). Em sua análise, a rivalidade das superpotências não dava a mínima esperança de algo promissor. O Papa João Paulo II concluiu que os tempos estavam maduros para uma diferente abordagem.  Ele havia refinado, na sua convivência com o comunismo na Polônia,  a estratégia de que as minorias e as maiorias podem reclamar os seus direitos fora do controle do totalitarismo e inescrupuloso controle militar, característico dos governos comunistas, como aconteceu com o movimento Solidariedade. Diante das posturas acomodatícias dos seus antecessores , adotou uma posição de firme intransigência de defesa dos valores tradicionais da Igreja. A sua ação, como foi entendida, era uma estratégia“muscular”. 


Para João Paulo a sua  abordagem não excluía o diálogo. Ao contrário, fez  contatos com todos os líderes mundiais. Viajou pelos quatro cantos do mundo impondo a visão de que a Solidariedade, movimento operário polonês, ganhou a liberdade econômica e cultural debaixo da aegis do Comunismo Polonês. Portanto,  o mundo tinha um claro exemplo de que ambos Comunismo e Capitalismo não necessariamente resultam em escravidão ou miséria ou militarismo devastador. 


Enquanto a Solidariedade na Polônia caminhava para afrouxar os grilhões do Marxismo  na vida sociocultural polonesa, na Nicarágua, os Jesuítas almejavam implantar um regime Marxista que abarcasse  toda a vida sociocultural, política e econômica dos nicaraguenses. João Paulo sabia que se não controlasse os Jesuítas na Nicarágua, ele  simplesmente não os controlaria em lugar algum. Já os jesuítas sabiam, que se o Papa frustrasse a sua explícita política de ativismo em favor do regime Marxista, eles teriam falhado em seus objetivos. Era claramente uma situação de confronto. Uma guerra estava em andamento entre os Jesuítas e a Igreja.


A doutrinação marxista dominava a América Latina. No Brasil o Venerável Cardeal Dom Vicente Scherer reportava  que textos Marxistas eram inculcados nos estudantes do Colégio Anchieta em Porto Alegre, onde o Sacramento da Confissão e Comunhão eram colocados como um anacronismo; o bispo Mendes Arceu em Cuernavaca começava o seus sermões com o gesto de saudação Marxista e declarava - “sou Marxista” ; o Venerável Cardeal Evaristo Arns, de São Paulo, não perdia oportunidade para condenar o capitalismo e laudar a redistribuição da riqueza para aliviar a pobreza.


Neste entretempo, Arrupe, Superior General dos Jesuítas, é eleito para a poderosa posição de Presidente do Conselho do Superior das Ordens Religiosas e Congregações. Crescia o poder dos Modernistas sobre os Tradicionalistas . A arrogância de Arrupe cresceu  levando-o  a esquecer o adágio romano: “Cardeais são fracos como amigos, mas terríveis inimigos”. Enquanto João Paulo recuperava a saúde depois do atentado sofrido  ( julho de 1981 ), ainda fragilizado, decidiu que Arrupe deveria ser destituído da posição de Superior General da Sociedade de Jesus. O que acabou acontecendo.


Teóricos da Libertação.



Uma gama de intelectuais contribuíram com as suas ideias para consolidar  a nova posição da Companhia de Jesus: 


Arthur F. McGovern, S.J., destacado e convincente apologista do anticapitalismo Jesuíta. Publicou em 1980 o livro — Marxism: Uma Perspectiva Americana. Essencialmente, McGovern diz que Marxismo só é uma crítica social. Max só queria que pensássemos sobre os meios de produção e distribuição, dos que possuíam e controlavam esses meios, que  podemos aceitar a luta de classes. Ela existe. É uma revolução, mas não quer dizer violência. Significa que temos que ter uma outra espécie de sociedade, definitivamente não o capitalismo que conhecemos.


George Tyrrell, S.J. professor de filosofia para formação de jovens jesuítas. Era um desencantado com a política oficial dos Superiores Jesuítas com respeito ao movimento Modernismo. Tyrrel apresentava-se como inquestionavelmente um antimedivialista e Modernista.Muitos dos atuais proeminentes teologistas e bispos consideram George Tyrrel o seu verdadeiro ancestor. Entusiastas da Teoria da Libertação são seus seguidores na crença de que a teologia não vinha de cima - da hierarquia da Igreja -  mas debaixo, do” Povo de Deus”. De onde nascem as “comunidades de base”.


Pierre Teilhard de Chardin, S.J. procura entender o tipo de mudança que a Sociedade de Jesus passou. Desde a recalcitrância a todo e qualquer desejo que a Sociedade aprendeu  a praticar,  a máxima sinceridade desta atitude e a distância que agora separa do ideal de Ignácio e da fé comum na Igreja Católica Romana. Ele compatibiliza a teoria criacionista com a evolução das espécies darwiniana. Para ele, Deus em um determinado momento da evolução intervém e insufla o espírito e a alma imortal em um ser  já desenvolvido, um “ animal superior”.  


Jacques Maritain, filósofo católico, em 1930 escreveu um dos mais influentes livros na história do humanismo, o Integral Humanism. Para Maritain o grito da Revolução Francesa - Liberdade! Igualdade! Fraternidade, era a erupção do pensamento Cristão na ordem política. Mauritian adotou a teologia da história baseada na filosofia Marxista.


Pedro Arrupe - o Papa Negro


Com a morte do Superior General da Sociedade de Jesus, Jean-Baptiste Jansen, em 5 de outubro de 1964, o Papa Paulo deu autorização para a eleição do novo Superior General. Entre os Jesuítas Superiores em Roma, os sentimentos estavam divididos. Havia os tradicionalistas e os modernistas, estes de espírito antipapalista. Porém, ambos concordavam com o sentimento de que  o tempo  de uma “ renovação “ não tinha ainda chegado. Mesmo os mais progressistas dos Superiores acreditavam que o tempo tinha que ser o correto ( negrito meu ). Entre os questionamentos, talvez a mais revolucionária mudança era a rejeição da convicção Católica de que os homens e as mulheres moviam-se dentro de um fechado paradigma da Cristandade: Criação, Pecado Original, Redenção por Cristo e a fundação de uma Única, Verdadeira, Total, Romana, Igreja Católica.

Para a eleição de um novo Superior General, foi convocada uma Assembleia Geral, que era composta por delegados representativos das diversas comunidades. Os delegados sabiam mais ou menos o que desejavam de um Superior General: um homem que “ reconhecesse profundamente a inquietação da humanidade. Um homem com discernimento e lucidez, comprometido com as lutas de classes” .  Como síntese deste ideal, surge na terceira votação , Pedro Arrupe, de 58 anos. É escolhido  como o vigésimo sétimo Superior General da Sociedade de Jesus. Assim como Ignácio de Loyola, o fundador dos Jesuítas, ele era Basco. Estudou medicina na Universidade de Madri, mas experimentou uma profunda conversão ao presenciar três milagres em Lourdes, na França. Entrou para a Ordem dos Jesuítas e ordenou-se padre na Holanda em 1936. Em 1938 foi como missionário ao Japão. Tornou-se grande admirador da cultura japonesa, um Japanofilo. 

Durante a Segunda Guerra ficou preso por trinta e cinco dias, sendo  submetido a intensos interrogatórios pela temível polícia japonesa, a KEMPEI-TAI. Libertado, os seus superiores decidiram colocá-lo na obscuridade. Foi transferido para um modesto bairro a quatro milhas de Hiroshima. Em 1942, Arrupe foi promovido a Superior e Mestre. Tendo já acrescentado a língua japonesa às que já falava:Espanhol, Holandês, Alemão, Inglês além do dialeto Basco. Um fato que o tirou da desejada obscuridade aconteceu no dia 6 de agosto de 1945, às 8:15 a.m. . A primeira bomba atômica explodiu em Hiroshima. Arrupe de pronto enviou uma equipe de socorro. Eram  os primeiros socorros médicos a chegar em Hiroshima. O governo japonês demorou sessenta horas para aparecer. Até o fim da vida, Arrupe, com a lembrança da catástrofe que presenciou, nunca perdeu o sentimento de surpresa do seu renascimento em Hiroshima. Ele costumava dizer que” Hiroshima não se relacionava com o tempo. Pertencia à eternidade”. 

Os japoneses nunca se esqueceram da incansável ajuda que ele  prestou em Hiroshima. Durante vinte anos que ainda viveu no Japão, depois de 1945, Arrupe tornou-se uma reconhecida celebridade.

O erro básico do Arrupismo, se assim podemos classificar o movimento renovador de Pedro Arrupe, foi ter usado a poderosa energia da Sociedade de Jesus para conquistar o ideal do Novo Homem ( Marx ) em um ambiente terrestre , deixando o ideal supernatural presumivelmente para ser cuidado em um estágio posterior. Outros  enganos, foi negligenciar os alertas papais, a sua desobediência aos desejos de três Papas , a aprovação de excessos que violavam  a Lei de Deus e as tradicionais regras de comportamento religioso.


Piet-Hans Kolvenback 


Pedro Arrupe foi substituído como Superior General por Piet-Hans Kolvenbach (1983/2008 )  que demonstrando força e olímpico distanciamento podia ser o espírito que poderia impor uma reviravolta nos eventos. Em sua maneira suave de falar, ele poderia pronunciar as primeiras palavras de real intenção de cessar a guerra dos Jesuítas contra o papado. As esperanças morreram com o discurso aos delegados do General Concílio , que o elegeu,  em uma simples opção, típica do Arrupismo: “ nós serviremos o Papa, se fazendo isto estivermos  servindo ao homem. Servir ao homem em sua preocupação com a injustiça política e o desejo material que permanecerá como a primeira preocupação dos Jesuítas”.  Claro estava que os Jesuítas continuavam com as mesmas ideias da Teoria da Libertação. Kolvenbach renunciou ao cargo de Superior General dos Jesuítas em 2008. Três anos após a morte de João Paulo ll.



O pós Papa João Paulo



O enredo do livro abrange a história dos jesuítas do seu início em 1540 até 1986. A história, porém, não parou. Depois do Pontificado de João Paulo, que quebrou o ímpeto “ modernista” e a propagação da Teoria da Libertação, houve a falência da URSS, cujo marco foi a queda do Muro de Berlin, com a desmoralização do marxismo e a Teologia da Libertação. Em 2005, com a morte do Papa João Paulo, assume Bento XVl ( 19/04/2005 a 28/02/2013).

Bento XVl deu sequência à política tradicionalista de João Paulo, da qual foi importante participante . A sua renúncia nunca foi esclarecida. Renunciou lúcido, com saúde e competência para gerir as políticas do Vaticano.Tudo indica ter sido vencido pela ala dos modernistas. O reinante inconformismo dos cardeais com a perda do rebanho, que exigiam outra postura mais aberta da Igreja para atrair fiéis. Sem apoio político suficiente, Bento não conseguia pontificar. Renunciou. 

O livro não faz referências ao ânimo dos modernistas subjugados por João Paulo e Bento. Só a ingenuidade pode levar a acreditar, que depois da longa doutrinação da Teologia da Libertação, que a guerra tinha sido ganha. Foi vencida uma batalha. Como no passado “ não era tempo de renovação , o tempo não tinha ainda chegado“( negrito meu ). Estavam esperando o momento apropriado para mostrar as garras. E o momento surge com a redução da importância mundial da Igreja.  O rebanho está mudando para outras religiões. Os Pentecostais crescem vertiginosamente. De oito milhões de habitantes, estima-se a existência de 1 milhão de fiéis conquistados em dois mil anos. O materialismo tomou conta do mundo e por consequência atinge as religiões. As outras  denominações religiosas prometem bem estar e prosperidade na Terra, enquanto os católicos têm que esperar o Céu - se chegar lá! Não estaríamos, pois,  vivendo a ressurreição de alguma alternativa ( ou da própria )  à Teologia da Libertação propondo  a preferência aos pobres e injustiçados? 

A eleição do atual Papa - um jesuíta -  dá alguns indícios. Assume o nome de Francisco para identificar-se com a pobreza franciscana e a muitas outras teses defendidas pelos jesuítas de Pedro Arruba.


Papa Francisco l


Segundo a Wikipedia, “ o Papa Francisco l  é o primeiro papa nascido na América, o primeiro pontífice do hemisfério sul, o primeiro papa a utilizar o nome de Francisco, o primeiro pontífice não europeu em mais de 1 200 anos (o último havia sido o sírio Gregório III, morto em 741) e também o primeiro papa jesuíta da história. Foi eleito papa em 13 de março de 2013.


Ao longo de sua vida pública, o Papa Francisco se destacou por sua humildade, ênfase na misericórdia de Deus, visibilidade internacional como papa, preocupação com os pobres e compromisso com o diálogo inter-religioso. Ele é creditado por ter uma abordagem menos formal ao papado do que seus antecessores, por exemplo, escolhendo residir na casa de hóspedes Domus Sanctae Marthae, em vez de nos aposentos papais do Palácio Apostólico usados por papas anteriores. Ele sustenta que a Igreja deve ser mais aberta e acolhedora. Ele não apoia o capitalismo desenfreado, o marxismo ou as versões marxistas da teologia da libertação ( será? pergunto eu ). Francisco mantém as visões tradicionais da Igreja em relação ao aborto, casamento, ordenação de mulheres e celibato clerical”.

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Conclusão 


Essas indagações, como conclusão, são  simples especulações a merecer que Malachi Matin escrevesse sobre os bastidores do Vaticano de 1986 até os nossos dias. Há muito o que seria interessante saber da renúncia de Bento XVl e a eleição de um jesuíta  sul-americano, da  língua mais falada na América Latina, agindo com as massas como um político populista, um discurso sedutor às minorias, a exibição de uma vida austera, e um discurso que faz pensar no ressurgimento das ideias revolucionárias dos jesuítas.  


Esta resenha é um convite à leitura de um texto sedutor por esclarecer as entranhas das lutas recentes dos Papa Brancos contra os Papas Negros, e as suas consequências. Teria chegado o tempo correto para a renovação?


Jorge Wilson Simeira Jacob 

Publicado no Jornal Opcao

Coluna Contradicao em 01.05.22.











sábado, 23 de abril de 2022

 A escolha de Sofia 


Imagine estar na situação da mãe , no famoso filme A Escolha de Sofia,  tendo que escolher a filha que deve ser enviada ao campo de extermínio nazista. Em situação similar estão os eleitores brasileiros na escolha do  próximo presidente. Porém, enquanto Sofia ama igualmente as filhas,  o eleitorado mais esclarecido não morre de amores por nenhum dos candidatos. Razões para isto existem. Nenhum dos dois encarna a figura de um estadista e, na  prática, como já  exerceram a presidência,  não mais podem apresentar-se como salvadores da pátria. São políticos da velha guarda. Não tem um projeto de desenvolvimento do país. Nenhum dos dois têm uma liderança na opinião pública que lhes dê legitimidade para as necessárias reformas do Estado. No histórico, Lula rendeu-se ao fisiologismo, corrompendo os partidos políticos , abrindo  os cofres das estatais para a cupinchada local e internacional ; e Bolsonaro dando poder  ao Centrão. Tudo em troca de ganhos mesquinhos para os seus interesses eleitorais, no  jogo pequeno do poder pelo poder.


Como estamos próximos das eleições e sem nenhum outro candidato, que tenha despontado como um líder carismático, capaz de emocionar as massas, o desafio das sofias limita-se  a escolha entre os existentes. Lula, segundo todas as pesquisas, desponta como o favorito. Aparentemente a condição de condenado pela justiça por corrupção e pelos adversários por desatinos administrativos, inclusive com a responsabilidade pela eleição da  desastrosa Presidente Dilma,  não colou na sua imagem. Continua no imaginário das massas como um vendedor de esperanças. Com a falsa promessa de dias melhores.


Ao contrário, Bolsonaro tem como pecado capital ser um demolidor das esperanças. As suas contínuas campanhas contra tudo e contra todos, mesmo quando corretas, tingem negativamente a sua imagem como a de um eterno zangado. Além de não ter realizado nenhuma das reformas estruturais prometidas na  campanha, ele não dá horizontes de dias melhores. A alegada justificativa de ter sido impedido pelos outros poderes,  passam pela mente das pessoas simples como retórica de perdedor. Um presidente é eleito para liderar o executivo e conseguir o apoio dos outros poderes. Isto ele não conseguiu. Nem o ponto forte da sua eleição , o  Posto Ipiranga , mostrou para o que veio. Ele, nem no seu quintal , o poderoso Ministério da Economia, fez qualquer desburocratização. Continua a ser um ministério de intervencionistas. Não será mais um avalista para uma futura presidência . Morreu na praia da  propaganda enganosa.



A sorte também é um fator que tem peso no inconsciente popular. Lula é um sortudo, herdou boas condições do governo anterior e   uma economia internacional favorável ao Brasil . Bolsonaro, é um azarão, recebeu uma  herança maldita e , no maior tempo do seu governo, teve o COVID 19, cujas consequências são um desemprego monumental, a perda do poder aquisitivo e um nível desanimador nos negócios. 


 Uma eleição sempre é importante, mas ganha relevo quando acontece em  situação econômica delicada em que vivemos. Defrontamo-nos não só com um  desafio  de curto prazo, mas fundamentalmente com a viabilização econômica do País. O Brasil está estagnado há décadas. A crença no futuro está abalada. Reformas estruturais são indispensáveis para criar condições ao desenvolvimento. 


Infelizmente, nenhum dos dois candidatos reúne essas condições. Eles não têm uma visão  idealista de governo e a determinação de um estadista. Culturalmente despreparados, só vêm as próximas eleições. Fazem  política pela política! Nada além do usufruto do poder.  Justo agora que  necessitamos de um líder com visão de futuro para a nação.  Lula é um vendedor de ilusões, o que seria útil no momento. Mas a longo prazo as suas propostas são o oposto do necessário para deixarmos de copiar a falida Argentina ou, pior, virar uma Venezuela. O populismo socializante, com o   aparelhamento do governo, a estatização e a  leniência à corrupção,  compromete o   futuro. Não dá para ser otimista com   dose  dupla de nenhum dos dois! Restando aos ideológicos  somente um voto plebiscitário, escolhendo entre   os mais quatro anos do conservadorismo   do Bolsonaro  ou os possíveis oito do socialismo do Lula. As sofias anularão o voto, à espera de dias melhores…se o socialismo não se perpetuar.



Jorge Wilson Simeira Jacob

Publicado no Jornal Opcao

Coluna Contradição em 24. 04. 22 




sábado, 16 de abril de 2022

 Igualdade de todos perante as leis.


Nada mais civilizado do que o preceito constitucional que assume que todos deveriam ser  iguais  perante a lei. Na prática, porém, sabemos que uns são menos iguais do que os outros. Neste jogo de poder participam dois grupos de atores. De um lado os algozes, que  têm o poder de influenciar as leis, decretos e regulamentos governamentais. Do outro lado as vítimas, que são os cidadãos de segunda classe, os anônimos. Uma divisão que situa o mundo  entre  nós eles. Entre eles inclui-se  a igreja católica que sempre  teve grandes privilégios no país e ainda hoje exerce forte influência na política nacional. Até  o Decreto nº 119-A, de 07/01/1890, de autoria de Ruy Barbosa, o catolicismo era a nossa religião oficial, sendo as outras somente toleradas em cerimônias caseiras. Felizmente, com a separação entre a igreja e o estado , além de assegurar a liberdade religiosa, muito da sua condição privilegiada  foi reduzida. 


Como agnóstico, que não acredita em nenhuma religião, entendo o estado laico como uma grande conquista liberal, uma  condição fundamental na preservação da liberdade individual. Ninguém deve ser forçado ou coagido a seguir nenhuma crença, nem religiosa e nem política. Se ao longo da  história alguém violentou a vontade do indivíduo foram as religiões e as crenças políticas. Elas  não economizaram esforços para subjugar a vontades dos “rebeldes”. Em especial, as religiões escreveram um enredo macabro de autoritarismo, com perseguições, crimes e barbaridades. As disputas pelos crentes sempre terminavam em guerras. Ora eram os politeístas romanos contra os cristãos, ora os católicos contra os muçulmanos, ora os protestantes contra os católicos …. As mais nefastas práticas de fanatismo são as das religiões. Superam em tudo e por tudo os outros tipos de fanatismos. Talvez na política  a bandeira do comunismo tenha mais manchas de sangue de inocentes,  do que a das religiões, por estas terem acontecido quando a população mundial era menor. Mas os dois séculos da  Santa Inquisição,  as Cruzadas para combater a expansão dos  muçulmanos,  a Inquisição protestante na Alemanha, a guerra religiosa nas duas Irlandas, superaram  em crueldade as perseguições políticas . 


Todo autoritarismo é indesejável, principalmente para nós cidadãos de segunda classe, anônimos. Somos indefesos contra os fanatismos de qualquer tipo. Felizmente com o estado laico, a liberdade religiosa prosperou aqui. Mas resquícios ainda existem, e devem ser eliminados. Ficamos no meio do caminho para tentar fazer valer a condição de serem todos iguais perante as leis. Esta igualdade  exige que se cancele todos os  feriados religiosos ou que se comemore com  igualdade de condições o dia da ascensão  da mãe de Buda aos céus, o nascimento de Moisés,  Maomé , Alan Kardek e outras efemérides . O ideal seria  cancelar do calendário nacional todos os feriados religiosos, pois isto são resquícios de um estado religioso. 


O Brasil tornou-se legalmente um Estado laico, na prática a desigualdade  diminuiu mas não acabou.  Há  vestígios a serem apagados. O ideal de igualdade seria atingido se todas as regalias religiosas fossem eliminadas com o fim: das isenção de todos impostos, dos feriados religiosos, dos retratos de santos em sítios do governo… Não é igualitário que um agnóstico pague a parte dos impostos que caberiam aos religiosos pagar,  e que seja obrigado a  comemorar as datas das outras religiões Como também não o é que nós , os de segunda classe, paguemos impostos exagerados para sustentar uma máquina pública ineficiente e perdulária, que se beneficia desigualmente da burras do tesouro.




Jorge Wilson Simeira Jacob

Publicado no Jornal Opção,

Coluna Contradição, em 17.04.22


domingo, 10 de abril de 2022

 




Um Sonho Impossível.



Esta é minha busca, seguir aquela estrela

Não importa quão sem esperança

Não importa quão distante

Lutar pelo que é certo

Sem questionar ou repousar.

O mundo será melhor por isto!

Elvis Presley



Inspiro-me nesta canção  diante dos meus grandes desafios. Em vez de deixar-me abater pelo impossível, encontro ânimo nos versos de um outro visionário. Não fossem visões como esta, como poderíamos nos conformar com o desacerto do nosso Brasil? Como enfrentar de cabeça erguida a  miséria de muitos de nossos concidadãos? Não nos faltam razões para o inconformismo. Fomos  abençoados com as  melhores condições de território, clima, povo…para o desenvolvimento econômico. Temos todas as condições materiais para sermos uma nação sem miséria. Só temos como referência para comparação em potencial de desenvolvimento  o país mais poderoso do mundo - os Estados Unidos da América. Vontade não nos falta. Então o que tem feito com que o nosso  desejo legítimo de sermos uma nação próspera pareça um sonho impossível?


A nossa economia não cresce há duas décadas. A renda per capita é inferior à da decadente  Argentina. Os nossos assalariados disputam remunerações miseráveis. Temos a pior das desigualdades: salários, vantagens e regalias à nomenclatura e miséria à camada menos favorecida. O mérito, que deveria ser o critério de premiação, está desvirtuado. Não se premia  o  espírito empreendedor, talento inventivo, esforço físico, mas os  “amigos do rei”. Em consequência, nestas décadas, o que prosperou foi o tamanho do governo. Desde a proclamação da República ( 1889 )  o custo do governo subiu de 7% do PIB para estimados 50% ( incluindo déficit público e inflação) * .Destes  97% são desperdiçados com o custeio da máquina e uma migalha com gastos sociais. O resultado, sem ter investimentos,  é a atual estagnação da economia. A qualidade de vida da maioria não melhorou e a infraestrutura deixa a desejar.


Porém, a coisa poderia ser menos ruim. Um governo sem recursos para investir poderia ter como compensação investimentos da iniciativa privada, que tem sido a salvação da “ lavoura “ , mas esta está castrada pela burocracia, insegurança jurídica e instabilidade política. Chegamos, assim, a inviabilizar a economia mais propícia de ser viabilizada - a do Brasil. A tal ponto chegamos que os brasileiros atravessam o deserto do México para ser trabalhadores clandestinos nos Estados Unidos e outros  têm depositados US$ 400 milhões no exterior, que poderiam estar investidos aqui para emprego daqueles que emigram.


O Brasil se tornou, politicamente falando, um travesti. Nem é uma administração centralizada e nem é o  modelo de  federação, que copiamos dos americanos. Em uma federação  os estados têm autonomia e o governo central cuida das funções básicas, respeitando a independência dos estados. Mas, no nosso caso, fizemos um jogo duplo: a União duplica todas as funções existentes nos estados. Não só duplicam-se os custos como multiplica-se a burocracia estatizante. O ideal do modelo federativo, o princípio da subsidiariedade,  é a descentralização tendo em conta  o respeito às características regionais. Nem sempre o que é bom para um estado é bom para os  demais. O poder de decidir é mais eficaz quanto mais perto está do fato. E os fatos acontecem nos municípios, estados e só depois na união. Este modelo surgiu nos Estados Unidos , como diz  o próprio nome, por terem se formado da união de estados independentes , 13 no início, mas foi deformado aqui por termos  surgido de uma monarquia sobre um território único. No modelo travesti  o país do futuro está inviável!



Um sonho impossível seria voltarmos à ideia original republicana de  sermos realmente uma Federação. Neste sonho,  Brasília teria no máximo 6 ministérios, Defesa, Economia, Relações Exteriores,  Higiene e Saúde, Meio Ambiente e Casa Civil, que coordenariam as ações de caracter nacional, mas respeitando a independência dos secretários estaduais de cada função. Brasília , em vez de 3,1 milhões de habitantes, teria a população de Washington  ( capital do mundo ) de 690 mil. Com a redução do patrimonialismo, da burocracia e da corrupção o governo seria o mínimo desejável. A arrecadação federal poderia ser reduzida tornando a economia competitiva - o que hoje não o é em termos internacionais. Esta deve ser  a  nossa busca : “ seguir aquela  estrela, não importa quão sem esperança, não importa quão distante, mas lutar pelo que é certo… O Brasil será melhor por isto! “



* Há um século, a renda per capita argentina era superior a quase todos os países europeus. Mas os gastos públicos, que nos anos 40 correspondiam a 10% do PIB, chegaram a 30% nos anos 70 e em 2015 atingiram 46%”

O Brasil copia o modelo que inviabilizou a Argentina.

Fonte: O Estado de São Paulo, A14, 17 de novembro de 2021.


Publicado no Jornal Opção,

Coluna Contradição, em 10. 04. 22


Jorge Wilson Simeira Jacob

domingo, 3 de abril de 2022

 A única estatal boa.


As empresas  sob o comando governamental, as estatizadas, são  anomalias  no contexto político e econômico. Violentam o jogo do livre mercado. Corrompem o sistema político.Têm, comparáveis à Lua, duas faces: uma visível e uma  oculta. A diferença está em que a Lua é neutra. Não escamoteia e nem esconde nada. Já nas empresas estatais há muitos fatos que são camuflados para  passarem despercebidos . As estatais  são verdadeiras “ caixas pretas “. Estando,  em primeiro lugar, a serviço dos   interesses da própria burocracia e da classe política dominante. Têm os olhos voltados para o umbigo. A parte comprometedora das suas operações não são transparentes aos olhos do grande público. 



Há, como na Lua,  um lado oculto nas empresas estatais. Pouco é divulgado dos gastos abusivos com o seu quadro de colaboradores, que além de salários desproporcionais ao mercado, têm  planos  assistenciais escandalosos. Planos que dão cobertura generosa a parentes dos parentes … -  uma família ampliada. Ninguém controla os desvarios das benesses dos seus funcionários como não controlam os seus negócios estapafúrdios. Pasadena e as bandalheiras descobertas da Operação Lava Jato, na Petrobras e no BNDES, são pontas do grande iceberg. As falcatruas descobertas são  exceções de uma transparência que deveria ser a regra e não caso de polícia.


Os desmandos da Petrobras só não a levou à falência por ser um monopólio, que tem o suporte do Tesouro. Como monopólio transferiu aos consumidores, através de preços sem competição, os prejuízos com a  monumental  roubalheira . Só a ponta desse iceberg, que ninguém sabe o real tamanho, é razão mais do que suficiente para  privatizar a Petrobras. Roberto Campos, com muita clarividência, diferenciava as empresas privadas e as públicas. Segundo ele: “ as empresas privadas são as controladas pelo governo, as públicas são aquelas  que ninguém controla.”


Acresce a essas razões o fato de que os preços da Petrobras não são determinados pelo livre mercado. Seguem uma regra monopolista, rígida e imoral. Em  nenhuma empresa, em mercado competitivo, os preços são determinados pelos custos e mais o lucro. Nem são atrelados ao dólar como faz a Petrobras. Nas empresas privadas estes fatores são referências, mas é o mercado que determina os preços. Os lucros só são legítimos se retratam o diferencial da produtividade de uma  empresa em comparação aos seus concorrentes. Se não, é eticamente imoral, quer seja empresa pública ou privada.


Não é o que acontece nestas pragas. Os lucros do BNDES resultam dos recursos subsidiados do  Tesouro e da Petrobras, de um indesejável monopólio, que lhes  permite absorver  as suas ineficiências. Resultados que não retratam uma eficácia operacional. Se os  preços dos insumos importados sobem ou descem nos mercados internacionais; se o dólar oscila; ou se há desequilíbrio na oferta e procura , em mercado competitivo os ajustes podem ocorrer com reduções de custos,  melhor produtividade ou como investimento para ganho de market share. Por que a Petrobras transfere sempre nos preços para o consumidor as suas ineficiências ? É o monopólio que dá à empresa  esta condição privilegiada.


É imoral sim o sistema de formação de preços dos combustíveis no Brasil. Como mal, esta prática transcende a todas as mazelas comentadas: sinecuras, corrupção,  negócios tipo Pasadena… Os  inconvenientes da existência de uma empresa com poder de dar o  ritmo dos  preços básicos  na economia nacional deveria merecer melhor atenção do público em geral.


 A alternativa do governo interferir politicamente nos preços, tentação que está sempre no ar, não é a solução. Será nada mais do que mais uma distorção na ordem econômica. A empresa tem que vivenciar a sua realidade para  refletir a sua real eficácia nos demonstrativos contábeis e ter incentivo para melhoria da produtividade eliminando os desperdícios ou competindo  para ganhar a preferência do consumidor. A solução está na privatização!



“A única  estatal boa  é a que não existe”, disse J.R.Guzzo, no Estadao de 20. 03. 22


Jorge Wilson Simeira Jacob 

Publicado no Jornal Opção,

Coluna Contradição, 02.04.22