sábado, 10 de maio de 2025

 A deseconomia de escala


A economia de escala refere-se à redução do custo médio de produção à medida que a quantidade de bens ou serviços produzidos aumenta, resultando em maior eficiência e competitividade. 


Adam Smith, com a sua proposta da especialização, deu impulso a busca do aumento da produtividade (  economia de escala )  em todas as atividades humanas. 


Ainda que a indicação original objetivasse as atividades econômicas, a ideia universalizou-se. A medicina, por exemplo,  a  levou  ao limite segmentando os profissionais em partes do corpo humano ou da mente. 


A disseminação da ideia fez o  mundo reordenar todas atividades econômicas priorizando as vantagens competitivas decorrentes das vocações regionais, o que resultou na globalização.



 A globalização tornou-se  um novo modus operandi, que revolucionou as relações entre nações e empresas. Produção, transporte e distribuição foram influenciadas pelas vantagens comparativas. 


A concentração das atividades, segundo as   vocações regionais ou humanas, trouxe como resultado produtos e serviços de melhor qualidade e menor preço, beneficiando o consumidor e gerando oportunidades.


O terroir francês permite uma qualidade de vinho a um preço inferior ao produzido na Inglaterra ou Suíça. É mais econômico comprar vinho da França  e vender a ela o que ela não produz.  As  vantagens são tão evidentes a ponto de superar o sentimento bairrista e as ideias ultrapassadas da fase do Mercantilismo.


Por uma generosidade da natureza, a grande maioria das regiões do mundo  tem uma vocação a ser explorada. O deserto de Nevada, nos Estados Unidos, descobriu ser a liberdade geral a sua vocação, que resultou nas Las Vegas, a maior renda per capita do país.


Ignorar as vantagens comparativas  é nadar contra a correnteza. É desperdício econômico.


Como nenhuma região é autossuficiente , vivemos das trocas. Estas ensejaram a concentração das populações nas cidades. Quanto maior a população, maior a oportunidade de intercambio entre os seus habitantes. Mas, assim como os medicamentos tem efeitos colaterais, também a  tem o   crescimento populacional.


A deseconomia de escala



Enquanto, na fase inicial os  benefícios da   economia de escala beneficiaram os consumidores,  dando às populações produtos à preços acessíveis, a  evolução da medicina aumentou o tempo de vida. O resultado foi  a explosão populacional, que  concentrou-se  em  grandes metrópoles.



A população mundial , desde a revolução industrial, vem crescendo em alta velocidade. Países como China e India têm 1,5 bilhão de habitantes, cidades de milhões de habitantes  há a  centenas mundo afora. Esta superpopulação está cobrando a sua conta: 1 -  às pessoas — a queda da qualidade de vida pelo aumento da violência, trânsito congestionado, poluição geral e insociabilidade; e 2 - às empresas — escassez de insumos como água, energia, transporte e custo da mão de obra


A especialização e o  consequente aumento da produção, como a mudança do campo para as cidades, foram importantes conquistas, enquanto houve economia de escala. Depois de certo ponto, quando os custos aumentam mais  com a maior produção , há uma  deseconomia de escala.  


Os produtos ficam piores e mais caros; as cidades, enfrentam a deterioração das condições de vida: transito emperrado, pavimentação esburacada, custo elevado dos imóveis,  violência, poluição do ar, da agua e das áreas publicas.


Se as deseconomias de escala nas atividades empresariais  encontra solução na transferência para outro endereço, outra região, na super população, a solução é um decréscimo populacional. A atual tendência da queda da natalidade poderá ser o fim da atual deterioração da qualidade de vida nas cidades.


O preço a ser pago para a desejada melhoria da qualidade de vida, ensejada pela mudança demográfica,  será o custo do fim da atual bicicleta,  que gasta com a previdência hoje por conta do crescimento populacional. 


Thomas Malthus * ( 1766-1834 ) tinha parcialmente razão, o aumento demográfico seria o fim da humanidade, não por falta de alimentos como ele profetizava, mas por uma superpopulação, uma deseconomia de escala,  que faria a vida inviável. 


A atual deseconomia de escala sinaliza estar no fim a aposta no crescimento populacional. 



*A teoria de Malthus, também conhecida como Malthusianismo, é uma teoria demográfica que postula que o crescimento da população humana tende a ser maior do que o crescimento da produção de alimentos



Sao Paulo, 28 de abril de 2025

Jorge Wilson Simeira Jacob 

























sábado, 3 de maio de 2025

 



Tudo começou com Bismarck.


Na Prussia, atual Alemanha, no reinado de Guilherme l, 1883 , Otto Von Bismarck, o chanceler de ferro,  conduziu o país com uma política de “ sangue e ferro”. Ele notabilizou-se por unificar a atual Alemanha e pelo Welfare State, um programa assistencialista de proteção aos desamparados.


Esse sistema de seguro social tinha  um caráter eminentemente político. A iniciativa pioneira de Bismarck tinha como objetivo enfrentar os movimentos socialistas, que estavam fortalecidos com a crise industrial. Os resultados positivos  lhe deram a consagração social e inspirou governos mundo afora a reproduzir o modelo.


A ideia ganhou impulso com as teorias de Keynes de estímulo aos governos a  intervir na economia para corrigir as “falhas de mercado”. Segundo ele, o desemprego deveria ser corrigido com obras governamentais — mesmo que fosse cavar buracos e depois tapar. O  que importava era “o curto prazo, pois a longo prazo todos nós estaremos mortos”, dizia Keynes.


O New Deal de Roosevelt foi um exemplo prático da teoria keynesiana, ao  enfrentar  a grande crise de 1929, que havia provocado desemprego em massa nos Estados Unidos, criando empregos.


Como sempre acontece do uso se segue o abuso. No início, o Welfare State tinha um escopo limitado e até certo ponto elogiável ao  assegurar um mínimo de segurança para os trabalhadores. Na sequência veio o abuso: políticos populistas incrementaram as medidas de ajuda ao trabalhador desmedidamente. O objetivo passou a ser “comprar os votos” indistintamente.


No Brasil esta prática começou com o Presidente Getúlio Vargas, que copiou e ampliou a Carta Del  Lavoro  do ditador Mussolini. A Argentina levou à frente  a ideia com  Perón,  a partir de 1945,  até quebrar a que tinha sido uma das mais ricas e prósperas economias do mundo.


Entretanto, o uso e abuso dos governos não se limitaram às leis sociais e benefícios aos trabalhadores. A compra de votos também foi feita com empreguismo diretamente no governo ou nas empresas estatais; nas concessões de “bolsas” de todas as espécies; e dinheiro subsidiado para empresários ligados ao governo. Sem deixar de enfatizar o desmesurado aumento da burocracia governamental.


Os Estados Unidos, referência de economia capitalista,  também sucumbiu aos “abusos”, tornando-se  um estado pesado, caro, burocrático, com visível perda de eficiência e um sistema de saúde oneroso — Medicare e Medicaid, que subsidiam a  assistência médica  a um custo anual de $1,9 trilhões de dólares.


Tudo estava bem enquanto havia reservas a gastar. Não tão bem quando o endividamento tornou-se insuportável: o  governo americano  custou, em 2025,  7 trilhões de dólares; há forte desequilíbrio no balanço de pagamentos; e um concorrente competitivo como a China.


A hora da verdade estava à espera de um estopim para fazer valer a realidade. Este detonador foi o Presidente Trump, que diante do desafio, declara guerra simultaneamente contra tudo e contra todos. Provocou um choque que abriu as cortinas — o rei estava nu!


 Os desdobramentos foram a desorganização da economia americana e mundial, a quebra dos acordos internacionais, o ressentimento dos países ameaçados e tratados com desprezo e last but not least a perda da confiança entre os pares. Com isto,  os  Estados Unidos perdem a imagem impoluta de ser o   porto seguro para investimentos financeiros e parceiro confiável. A virgindade foi perdida.


Por sí só , a situação econômica dos Estados Unidos já é preocupante, mas torna-se mais grave ao verificar que o resto do mundo também está comprometido. Todos os países, com raras exceções ,embarcaram nos excessos do Welfare State, no governo inchado e burocratizado, no desequilíbrio orçamentário e no endividamento, que come com juros muito da renda nacional.

 

Com o governo inchado não sobra dinheiro para investimentos produtivos, a consequência é o  atual baixo crescimento da renda per capita mundial. As pessoas aspiram melhorar as suas condições de vida. Em não conseguindo, ficam revoltadas. Progredir na vida é como a velocidade da bicicleta. É condição de equilíbrio social, que esmola não resolve.


Enfim, tudo começou com Bismarck,  alimentado por Keynes e explorado pelos  populistas. Eles deram aos políticos uma teoria para justificar um populismo socializante. 


A solução não será a guerra contra tudo e contra todos de Trump. O caos em que o mundo está submerso não será salvo com mais intervencionismo, com protecionismo, mas com menos governo. Um governo que custe menos em impostos e burocracia para dar condições competitivas às empresas. Um custo país que não seja superior ao dos países concorrentes*.


A hora do governo mínimo está chegando, pois a realidade vai colocar freios nas políticas de governos que, a título de fazer justiça social, compram votos. 


* O  governo chinês aplica boa parte da arrecadação  como facilitador da produção barata e competitiva, enquanto o governo dos Estados Unidos  gasta mais com serviços sociais e defesa — o que não necessariamente reduz o custo dos produtos.


São Paulo, 21 de abril de 2025.

Jorge Wilson Simeira Jacob 














sábado, 26 de abril de 2025

 Mario Vargas Lhosa


Ninguém é insubstituível. Se assim não fosse a humanidade não teria chegado aos nossos dias. Mas há personalidades que devido às suas qualidades e/ou virtudes fazem diferença neste mundo. Outros são aqueles a quem amamos ou admiramos, que se tornam uma exceção à regra. 


Entre os substituíveis estão  os muitos que fizeram muito mal à humanidade pela sua atuação nos diversos campos das atividades. São os tiranos políticos, os intelectuais de ideias equivocadas, os artistas deslumbrados , que fizeram o mundo pior.


Contrapondo-se a esses,  estão os políticos democráticos, os intelectuais lúcidos e os artistas não comprometidos, que fizeram  o mundo melhor.


Essas ponderações veem à tona com a triste noticia do passamento do escritor peruano Mario Vargas Lhosa. Um ser insubstituível para os seus órfãos: a sua família e  os seus admiradores. Autor de obras imortais como A Guerra do Fim do Mundo, que corre em paralelo a outra obra prima, do brasileiro Euclides da Cunha, Os Sertões, fonte de sua inspiração .


Dois livros emocionantes, que dão vida aos jagunços seguidores de Antônio Conselheiro. São dois textos emocionantes,  que, muitos como eu, no término da leitura ficam entre o encanto do texto e a frustração de ter menos um bom livro para ler. 


Um bom livro lido é como uma paixão vivida intensamente,  deixa um retrogosto de encantamento, mas perdem a condição da novidade, da surpresa. Diz bem Vargas Lhosa  definindo  a literatura como a arte de tornar o impossível, no possível e o sonho, na realidade; é ela que nos propicia viver muitas vidas diferentes quando só temos uma; e transcender do  real para o ideal.


Os seus textos eram frutos de muito empenho. Para escrever A Guerra do Fim do Mundo ele viveu na região brasileira por alguns meses. Era um estudioso, que procurava dominar os eventos e a natureza humana para transmiti-la com eloquência nos seus livros.



Mario Vargas Lhosa, que conheci em um evento liberal, era, como pessoa: um modelo de modéstia,  sedutor, bom ouvinte, cordial e evidente empatia com as ideias dos interlocutores. Ouvia com a tolerância dos espíritos superiores as contestações às suas ideias. Não tinha a postura de um mestre, mas de um alguém desejoso de entender, de debater , de esclarecer. Era uma mente aberta à busca da verdade.


Arrependido da sua militância comunista, que o decepcionou por não entregar o prometido  mundo ideal e por ter  presenciado na Cuba comunista  a  prática da violência, da injustiça e da miséria. Ao ver o fracasso da utopia, testada em todas as  experiências, mudou com armas e bagagens para democracia liberal. Aderiu a democracia liberal não por ser perfeita, mas por ser o ideário que  mais reduziu a violência, a injustiça e a miséria.


Vargas Lhosa era generoso com os intelectuais e artistas. Não os acusava de aproveitadores da ingenuidade alheia em benefício próprio, mas condescendentemente justificava  a devoção deles ao socialismo. Atribuía à propensão dos intelectuais e artistas a estarem sempre em busca da perfeição, a qual acreditam  encontrar na utopia marxista do fim da injustiça social.


Uma tentação que ele como intelectual sucumbiu até a constatação dos desastrosos resultados, principalmente da revolução comunista de Cuba. Dedicado como era em não se deixar levar pelas aparências, mas em buscar a verdade, a descobriu, segundo declarou, nos textos de Raymond Aron.


 No livro  O Ópio dos Intelectuais), Aron argumenta que: “o povo estaria fanatizado pela religião (o ópio do povo) o intelectual estaria fanatizado pelo marxismo (o ópio dos intelectuais). O ópio embota a percepção e a crítica, e a imagem, para Aron, vale para uma concepção de povo, e vale também para uma concepção de intelectuais”.


Premio Nobel de literatura , com

Garcia Marques e Cortazar, chamou a atenção do mundo para a realidade sul americana . Vargas Lhosa era um cidadão cosmopolita.  Viveu e vivenciou diversas culturas, mas nunca se sentiu como um estrangeiro por causa dos livros. Considerava a Espanha que lhe concedeu a cidadania espanhola quando, por razões políticas, esteve ameaçado de perder o passaporte peruano.


Morreu no Peru a sua terra natal à qual dedicava um amor filial. No seu maravilhoso discurso, ao receber o Prêmio Nobel ( ver no YouTube, El discurso completo de Mario Vargas Lhosa ao receber o Prêmio Nobel de Literatura ), ele define com a elegância do seu estilo de escrever as razões do amor que temos pela terra em que nascemos: “ o patriotismo não pode ser imposto, é algo que está em nós. É a consciência íntima de saber que existe um lugar para o qual sempre podemos voltar — a pátria”.


Mario Vargas Lhosa viveu intensamente. Correu o mundo, amou muitas mulheres, escreveu livros, artigos e teatro,  fantasiou-se para o Carnaval Carioca, frequentou a casa Real espanhola e foi candidato derrotado à Presidência do Peru, com um programa liberal.Desta experiência resultou o livro Peixe Fora D’Agua que descreve a sua trajetória eleiçoreira.


Se ninguém é insubstituível, menos aqueles que amamos, como defensor da liberdade individual, ele é daqueles que fez o mundo diferente. 


São Paulo, 18 de abril de 2025.

Jorge Wilson Simeira Jacob