O Capitalismo Criou A Classe Média.
Não há exagero em lembrar que nós respiramos o ar sem dar-nos conta da sua importância, a menos que ele nos falte. Habituados ao oxigênio em troca de nada, o temos como um direito adquirido. Assim também, como se natural fosse, contamos com o desenvolvimento econômico e social como uma fatalidade, que não exige contrapartida. Dizemos: É só questão de tempo!Acreditam muitos que dias melhores sempre cairão do céu. Lamentavelmente a verdade é totalmente diversa. A evolução positiva da riqueza das nações é uma exceção. A maior parte do mundo vive na pobreza há milênios. Entre elas muitas com bom nível educacional e boa organização política. Sem contar as que retrocederam, como a Argentina, a Venezuela, a Grécia...
Ao longo de milênios predominou a estagnação. A crença na possibilidade do desenvolvimento é recente. Até a revolução industrial, as atividades limitavam-se à pesca, à caça e à agricultura. A ocupação da mão de obra, então ociosa, só tinha, como alternativa ao trabalho o campo, alguma atividade artesanal, a dedicação à guerra e ao serviço religioso.Não havia a indústria e os serviços. Os camponeses , que eram a grande massa, viviam na penúria, enquanto a nobreza, uma minoria, vivia na ociosidade. O tempo era preenchido nas guerras, como extensão das caçadas. Os recursos eram investidos em pirâmides, castelos, igrejas e conventos para comprar para o rei a unção papal. Nada sobrava para a grande massa. Estas nasciam e morriam na miséria. O equivalente à atual classe média era restrito ao pequeno artesão burguês.
A situação só começou a mudar depois da Idade Média, época da trevas. O fator desencadeador do novo modelo foi o período tido como o Iluminismo, época das luzes*. Os iluministas ao desvendarem os segredos do Universo abalaram o carisma da igreja, como representantes de Deus na Terra . Enquanto a religião católica explicava a vida apelando para a fé e aos dogmas, o Iluminismo usava da razão e encontrava respostas na ciência. A perda da credibilidade da Igreja foi seguida da menor capacidade de influenciar as massas e os próprios reis**. Com isto perdendo o poder de barganha política e econômica, que era negociado em troca da benção da Igreja. Não por outra razão o Vaticano ***usou de todos os recursos para calar a ciência, sendo os trezentos anos da Inquisição e as Cruzadas marcas negras na sua história . Perdeu a Igreja e também os reinados com o fim da crença de serem os reis uma concessão divina. Os reinados sem a sustentação divina foram sendo substituídos por governos democráticos, dando ao povo o poder de exigir melhores condições de vida.
A partir da revolução industrial, propiciada pelas ideias dos iluministas, vem o advento do capitalismo e o fim do feudalismo. As populações concentram-se nas cidades criando oportunidades de trabalho para a mão de obra liberada dos exércitos, do serviço e das obras religiosas. A produtividade, conseguida com as descobertas e inovações, trouxe aumento da oferta de produtos rurais e industrializados com o salto na produtividade. A miséria começa a ser reduzida com a mudança do modelo econômico baseado no mercantilismo para o capitalismo. A produção em massa exige consumo equivalente, o que força a redução dos preços para serem acessíveis a maior número de consumidores. O mercado exigiu das empresas métodos mais eficientes . Elas, pressionadas pela competição, encontram como a melhor solução para equacionar o desafio: a redução dos preços e o aumento dos salários***. E assim o capitalismo criou a classe média****.
- Iluminismo ou o “século das luzes”, pode ser entendido como uma ruptura com o passado e o início de uma fase de progresso da humanidade. Essa fase é marcada por uma revolução na ciência, nas artes, na política e na doutrina jurídica, por exemplo. O Iluminismo foi um movimento intelectual europeu surgido na França no século XVII, que defendia o uso da razão sobre o da fé para entender e solucionar os problemas da sociedade, dando e as bases para o desenvolvimento do liberalismo.
** Napoleão Bonaparte toma a coroa imperial das mãos do papa e auto-coroou-se desprezando a unção papal. Mas consciente do poder da igreja, ao ser questionado se não temia a guerra, ...respondeu que não, desde que tivesse os bispos a seu favor.
*** a história do Vaticano é semelhante à de outros impérios, que conheceram a ascensão e a queda . Até a idade média, organizada nos princípios de um reinado, com a sua corte, nobreza, exércitos, e coletores de dinheiro( os sacerdotes ) tinha hegemonia no Ocidente. Ao não disputar territórios, mas as almas, não colidiam com os outros impérios. Quando tinham interesses territoriais, faziam uso ( mão de gato ) dos reis católicos, dependentes da sua unção, como nas Cruzadas. As exceções foram as disputas pelas cidades-reinos da atual Itália , comandadas pelos Bórgias. O Iluminismo tirou, ao quebrar o carisma religioso e propiciar a revolução industrial, deu início a quebra da hegemonia católica e redução da miséria. Não pode ser esquecida a contribuição relevante da Reforma Protestante e atualmente a invasão dos crentes muçulmanos e dos pentecostais para a decadência do poder do Vaticano. A disputa pelos fiéis está intimamente vinculada ao poder econômico. Concordando ou não com Weber, a redução da miséria aconteceu nos países que se libertaram da influência religiosa do catolicismo.
**** O capitalismo criou a classe média, deixando para o passado a divisão entre a massa miserável e a nobreza. A pequena burguesia, que Karl Marx prévia desapareceria, foi mais uma das suas fracassadas profecias. Quanto maior o desenvolvimento do modelo capitalista, maior e mais rica é a classe média. Ao contrário do comunismo, que continuou dividido em duas classes - a nomenclatura ( os nobres antigos ) e as massas.