quinta-feira, 13 de maio de 2021

 O Patinho Feio


Há algumas décadas, o brasileiro sofria de  um complexo de inferioridade por ser o Brasil   uma nação agrícola. Invejava-se a pujança industrial do primeiro mundo. A Segunda Guerra Mundial, com os bloqueios navais e a produção dos nossos fornecedores direcionada à produção bélica,  criou  escassez dos insumos e dos produtos importados. Com isto acentuou-se  a aspiração nacional pelo  desenvolvimento da indústria local. A Teoria da Dependência *, de esquerda, promovida pela Cepal , influenciava a elite nacional com o desafio de deixarmos de ser a  periferia. A superação dependia de produzir de tudo para  tornar-nos autossuficientes protegendo a indústria nascente. Esta teoria equivocada, de triste memória, cujos porta vozes eram os seguidores do Raul Prebish, criou ambiente para uma aventura desenvolvimentista: os  Planos Quinquenais do Presidente Juscelino Kubitscheck e a loucura de Brasília. Com a demanda da mão de obra das novas  indústrias , a população do campo mudou-se maciçamente para as cidades, com a deterioração da vida urbana. As fabricas brotavam como praga, pois o protecionismo   tornara a produção local competitiva. Os industriais  agarraram-se nas tetas do governo, sendo a Fiesp o instrumento usado para  assegurar as barreiras alfandegárias , finaciamentos generosos e mercados cativos. A agricultura não tinha vez e nem prestígio. Era  o Patinho Feio da criação do Hans Christian Andersen. As exportações agricolas, basicamente o café**, sofriam confisco cambial para sustentar a indústria. Mal e mal  tinham como fonte de financiamento empréstimos com juros subsidiadas pelo Banco do Brasil***.


Por sorte o governo não protegeu os agricultores. Ficaram assim livres da “ mão visível” do governo, que tudo o que cuida fenece. Por sua característica, a agricultura presta-se  menos  ao controle do governo. Nada se sabe dos bezerros que nascem, das sacas de cereais colhidas e das vendas efetuadas. Com isto o agricultor administra o seu negócio com muita liberdade. Ele depende do tempo, do mercado e sobretudo da sua capacidade. Como o governo não protegeu a atividade, o empresário, para sobreviver, desenvolveu as suas habilidades empresárias. Sobreviveu às inovações,  às invasões das propriedades, cotas protetoras do mercado europeu, aos congelamentos de preços e às crises econômicas,  graças à determinação de vencer e do amor à terra. Segundo um líder da área : - a agricultura investiu em número de horas e no volume  financeiro, em pesquisa agrícola,  valor que  supera em muito aquele feito por nossos empreendedores industriais. O empresário agrícola brasileiro fez a sua parte, soube aproveitar da tecnologia para desbravar os Cerrados e otimizar o todo , sendo hoje internacionalmente respeitado pela produtividade das suas terras e qualidade dos seus produtos. E ao ter se  preparado pode ser premiado pela redução das cotas de importação da Europa e das crescentes importações chinesas. Sintetizando as palavras do citado líder agrícola: juntou-se o conhecimento com a oportunidade. Em outras palavras , a fome com a vontade de vencer. A independência foi a salvação da lavoura. 


Há que se acentuar de que este é um histórico de décadas. Não foi fruto de uma pequena aventura ou de um lance de pura sorte,  mas de uma visão de longo prazo. E aquele que era o Patinho Feio, que ilustrava o nosso complexo de inferioridade, hoje é um Cisne Real. Tornou-se uma  atividade com vantagem competitiva mundial, sem nenhum favor. E a indústria em geral, salvas algumas honrosas exceções, que era motivo de orgulho e júbilo, amarga - graças ao protecionismo governamental - não ter aprendido andar com as próprias pernas e , hoje, para competir ainda depende das tetas do governo. Ou melhor das tetas da agricultura que paga as contas.

  • Teoria da dependência, Wikipédia  - A teoria da dependência trata do relacionamento das economias dos países chamados "periféricos" com as economias dos países chamados "centrais" ou "hegemônicos", e que estas relações econômicas "dependentes" por parte dos países periféricos em relação às economias centrais, criavam redes de relações políticas e ideológicas que moldavam formas determinadas de desenvolvimento político e social nos países "dependentes" ou "periféricos".


**  Roberto Konder Bornhausen: O  café foi fortemente subsidiado... inclusive com compra do produto, pelo IBC , com preços artificiais ajustados....Ainda hoje o café detém cerca de 40% do mercado mundial, apesar de ter criado toda a concorrência internacional.Resultado: o café ,entre os produtos agrícolas exportados, é o mais atrasado tecnologicamente. 

Com relação a financiamento subsidiado sempre existiu( B.Brasil) e continua existindo, embora hoje  com menos significação , porque os juros no geral estão mais baixos.


*** Irapuan da Costa Júnior: a agricultura foi subsidiada até a estabilidade do Plano Real. De lá para cá foi a competitividade mesma que prevaleceu.


São Paulo, 13 de maio de 2021.

Jorge Wilson Simeira Jacob

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