O Patinho Feio
Há algumas décadas, o brasileiro sofria de um complexo de inferioridade por ser o Brasil uma nação agrícola. Invejava-se a pujança industrial do primeiro mundo. A Segunda Guerra Mundial, com os bloqueios navais e a produção dos nossos fornecedores direcionada à produção bélica, criou escassez dos insumos e dos produtos importados. Com isto acentuou-se a aspiração nacional pelo desenvolvimento da indústria local. A Teoria da Dependência *, de esquerda, promovida pela Cepal , influenciava a elite nacional com o desafio de deixarmos de ser a periferia. A superação dependia de produzir de tudo para tornar-nos autossuficientes protegendo a indústria nascente. Esta teoria equivocada, de triste memória, cujos porta vozes eram os seguidores do Raul Prebish, criou ambiente para uma aventura desenvolvimentista: os Planos Quinquenais do Presidente Juscelino Kubitscheck e a loucura de Brasília. Com a demanda da mão de obra das novas indústrias , a população do campo mudou-se maciçamente para as cidades, com a deterioração da vida urbana. As fabricas brotavam como praga, pois o protecionismo tornara a produção local competitiva. Os industriais agarraram-se nas tetas do governo, sendo a Fiesp o instrumento usado para assegurar as barreiras alfandegárias , finaciamentos generosos e mercados cativos. A agricultura não tinha vez e nem prestígio. Era o Patinho Feio da criação do Hans Christian Andersen. As exportações agricolas, basicamente o café**, sofriam confisco cambial para sustentar a indústria. Mal e mal tinham como fonte de financiamento empréstimos com juros subsidiadas pelo Banco do Brasil***.
Por sorte o governo não protegeu os agricultores. Ficaram assim livres da “ mão visível” do governo, que tudo o que cuida fenece. Por sua característica, a agricultura presta-se menos ao controle do governo. Nada se sabe dos bezerros que nascem, das sacas de cereais colhidas e das vendas efetuadas. Com isto o agricultor administra o seu negócio com muita liberdade. Ele depende do tempo, do mercado e sobretudo da sua capacidade. Como o governo não protegeu a atividade, o empresário, para sobreviver, desenvolveu as suas habilidades empresárias. Sobreviveu às inovações, às invasões das propriedades, cotas protetoras do mercado europeu, aos congelamentos de preços e às crises econômicas, graças à determinação de vencer e do amor à terra. Segundo um líder da área : - a agricultura investiu em número de horas e no volume financeiro, em pesquisa agrícola, valor que supera em muito aquele feito por nossos empreendedores industriais. O empresário agrícola brasileiro fez a sua parte, soube aproveitar da tecnologia para desbravar os Cerrados e otimizar o todo , sendo hoje internacionalmente respeitado pela produtividade das suas terras e qualidade dos seus produtos. E ao ter se preparado pode ser premiado pela redução das cotas de importação da Europa e das crescentes importações chinesas. Sintetizando as palavras do citado líder agrícola: juntou-se o conhecimento com a oportunidade. Em outras palavras , a fome com a vontade de vencer. A independência foi a salvação da lavoura.
Há que se acentuar de que este é um histórico de décadas. Não foi fruto de uma pequena aventura ou de um lance de pura sorte, mas de uma visão de longo prazo. E aquele que era o Patinho Feio, que ilustrava o nosso complexo de inferioridade, hoje é um Cisne Real. Tornou-se uma atividade com vantagem competitiva mundial, sem nenhum favor. E a indústria em geral, salvas algumas honrosas exceções, que era motivo de orgulho e júbilo, amarga - graças ao protecionismo governamental - não ter aprendido andar com as próprias pernas e , hoje, para competir ainda depende das tetas do governo. Ou melhor das tetas da agricultura que paga as contas.
- Teoria da dependência, Wikipédia - A teoria da dependência trata do relacionamento das economias dos países chamados "periféricos" com as economias dos países chamados "centrais" ou "hegemônicos", e que estas relações econômicas "dependentes" por parte dos países periféricos em relação às economias centrais, criavam redes de relações políticas e ideológicas que moldavam formas determinadas de desenvolvimento político e social nos países "dependentes" ou "periféricos".
** Roberto Konder Bornhausen: O café foi fortemente subsidiado... inclusive com compra do produto, pelo IBC , com preços artificiais ajustados....Ainda hoje o café detém cerca de 40% do mercado mundial, apesar de ter criado toda a concorrência internacional.Resultado: o café ,entre os produtos agrícolas exportados, é o mais atrasado tecnologicamente.
Com relação a financiamento subsidiado sempre existiu( B.Brasil) e continua existindo, embora hoje com menos significação , porque os juros no geral estão mais baixos.
*** Irapuan da Costa Júnior: a agricultura foi subsidiada até a estabilidade do Plano Real. De lá para cá foi a competitividade mesma que prevaleceu.
São Paulo, 13 de maio de 2021.
Jorge Wilson Simeira Jacob
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