Never More.
Sobra na imprensa falada e escrita a notícia da recepção cordial do Papa Francisco ao ex-presidente e ex-presidiário Lulla. À boca pequena especula-se : qual a razão para a Sua Santidade , como chefe da comunidade católica, receber com honras um pecador impenitente? Em não encontrando explicação, fofoca-se que a causa seria a canonização da ex-primeira dama Marisa. O que não faz sentido, pois a liturgia da santificação exige um tempo ainda não decorrido e provas de alguns milagres, dos quais (ainda) não se tem notícias. Em assim sendo, conclui-se: o motivo seria, como chefe de estado, cuidar dos interesses políticos do Vaticano. Business as usual!
Não há nada de novo nesta ação do Papa. A história registra a continua ação política e mesmo militar da igreja católica em defesa dos seus interesses. O Vaticano financiou as Cruzadas para deter o avanço dos muçulmanos no oriente médio . O cardeal César Bórgia comandou as tropas do exército papal para conquistar ou defender seus territórios na atual Italia. No Brasil o clero sempre tomou partido de acordo com suas conveniências, chegando a reproduzir o Partido Democrazia Cristiana, italiano, estimulando a formação do Partido dos Trabalhadores... Este é um pequeno retrato da real politick praticada pelo estado Vaticano - uma nação politicamente organizada, que não dorme de batina para defender os seus interesses.
Apesar destas reflexões, a minha curiosidade não estava satisfeita, mas como Edgar Allan Poe, fatigado e sonolento, como descreve no O Corvo, tomo assento no quarto de dormir e começo a reler este seu poema. Ao chegar no trecho em que o corvo surpreende o autor em seu escritório, sistematicamente respondendo às suas ponderações com o conhecido refrão - never more, never more - paro a leitura e , ainda especulando sobre o Papa e Lulla, dou asas à imaginação. Ocorreu-me então a ventura de ter uma ave, como a de Poe, que respondesse às minhas indagações. Como gostaria de saber qual teria sido a pauta da conversa entre o Santo Padre o Papa e o pecador Lulla? Nisto, de surpresa, como por um milagre, surge da janela, não uma ave negra, mas um pombo branco, que logo identifiquei como sendo o Espírito Santo, que tudo sabe e pode, a quem formulei o pedido que estava na ponta da língua:
- Espírito Santo, reproduza o ocorrido no encontro do Papa com o Lulla. Eu e o mundo estamos intrigados.
Fui atendido, eis o relato:
- Papa Francisco: depois dos comprimentos de praxe, diz à Lulla - sei que vc tem um irmão meu homônimo e sacerdote católico; sei dos vínculos do petismo com o clero , inclusive a nossa ajuda com a Teologia da Libertação; e, principalmente, estou acompanhando a perseguição política de que é vítima - uma injustiça a quem tanto se sacrificou pelos pobres. Saiba que entendemos que tudo nos une... só nos separam os pentecostais. O que podemos fazer para ajudá-lo?
- Lulla: Santidade, realmente devemos consolidar a nossa união. Até agora a nossa luta era entre nós e eles. Acolhíamos os pobres, os despossuídos e dominávamos a cena política sem dificuldade. De repente, surge um direitista-demagogo a disputar o nosso rebanho. Sem cerimônia se alia às falsas religiões e avança justamente sobre o território em que nadávamos soltos. A Sua Santidade sabe a fome de poder dessa gente. São lobos devorando os nossos cordeiros. Avançam no seu rebanho e no meu, sem cerimônia de copiar os nossos métodos. Cada fiel que se bandeia é um voto perdido. Perdemos juntos. Ou contemos essa corja ou eles se perpetuarão no poder. Temos que reagir, o seu rebanho e o meu eleitorado estão sendo dizimados.
- Papa Francisco: foi muito valiosa a sua visita. Infelizmente o Vaticano não mais tem um exército armado e nem o poder de reproduzir uma Santa Inquisição, no Brasil , para refrear esses lobos selvagens, mas faremos o melhor uso da fé dos pobres - que são o rebanho da nossa preferencia. Venha tirar uma foto comigo abençoando-o para sugestionar as massas e sinalizar ao clero que estamos do seu lado.
Lulla: Santidade, tenho certeza de que nossa união é a única esperança para salvar fiéis e eleitores. As nossas conquistas estão em risco. Se tudo der certo, como desejo, em um nosso próximo encontro poderemos abordar assuntos mais amenos como, por exemplo, uma chance de eu ser declarado santo da igreja católica ? O Padim Cícero brasileiro!
Nisto, antes de acordar, vendo o Espírito Santo abrindo as asas brancas para voar, lancei uma última pergunta:
- Espírito Santo, quando teremos, como chefes de estado e de governo, homens puros como foi Adão antes de comer a maçã?
A pomba alçou voo apressada, grasnando: never more, never more, never more...
As Minhas Reflexões.
Jorge Wilson Simeira Jacob
14 de fevereiro de 2020.
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