sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

 



HÁ ALGO DE PODRE NO BRASIL.


O Brasil tem mais faculdades de Direito do que todos os países no mundo, juntos. Existem 1.240 cursos superiores para a formação de advogados em território nacional, enquanto no resto do planeta a soma chega a 1.100 universidades ( https://www.direito.ufg.br) . Isto é chocante. Há algo de podre no reino da Dinamarca, como disse Shakespeare. Algo de podre existe no Brasil, suspeitamos nós . O que nos leva a perguntar: - Seríamos nós o povo mais beligerante da Terra? Ou simplesmente vivemos em um emaranhado de leis e decretos que, juntos, é  o maior do mundo?


Nunca, em tempo algum,  em nossa história, fomos considerados  uma sociedade belicosa. Ao contrário, a nossa tolerância é exaltada por quem nos conhece. Somos, como já foi dito,  um povo cordial. Não é, portanto, retrato de um “ estado de guerra civil”  o número de faculdades de direito no Brasil.


Excluída a primeira hipótese, ficamos com a  segunda : seria o anacronismo judiciário o responsável por essa situação? Em parte sim. Sofremos de um problema terrível — uma hemorragia legisferante. Produzimos um volume de Leis e Decretos, que deve bater também recordes internacionais. Um emaranhado incompreensível difícil de se entender e cumprir.  Até pelos legisladores, que se acautelam , ao acrescentar no final das leis e decretos,  a frase : - “revogam-se as disposições em   contrário”. Nem eles sabem a quantas andam.São tantas que virou piada - “ no Brasil, lei é como vacina, umas pegam outras não”. Temos vacinas para tudo. Sem falar no exotismo de termos todo um arcabouço judiciário especializado nas contendas trabalhistas — uma excrescência!


O  país é complicado sob o aspecto de legislação. Por isso  funciona mal e lentamente. O judiciário  demora cinco anos para julgar uma ação em primeira instância e mais de  vinte,  em segunda. O que mantém os advogados ocupados… e a economia improdutiva. As ações comumente terminam por decorrência de prazo, sem serem julgadas.

Temos excesso de leis, mas pouca justiça. 


Um país que tem 1 trilhão de reais  em contingências fiscais e outro tanto de ações trabalhistas tem algo de podre a ser eliminado.Vivemos em “estado de heteronomia”, situação característica de excesso de autoridade sobre o cidadão.  E é deste mal que sofre a nação brasileira. 






É tal o nosso emaranhado judicial  que já se tornou corrente a crença de “ nem o passado é previsível no país”. Só quem se aventura a ser empresário no Brasil sabe como  é difícil seguir as leis. Sem falar nas surpresas que o passado nos dá. Se abrir uma empresa é difícil, encerrar é impossível. Não se consegue.  No que resulta uma quantidade significativa delas  mortas insepultas.


As Faculdades de Direito só existem por haver  procura. Não são fantasmas. Elas têm alunos. As faculdades de direito não sobreviveriam sem eles. E só há alunos por haver demanda para a sua função. Há, porém, outro  fator  a alimentar essa corrente  —  a nossa cultura elitista. Ter um doutor na prole é questão de prestígio e ascensão social da família. Os desbravadores, na época da monarquia, não existindo faculdades no país, mandavam os filhos para ganhar um título de doutor na Universidade de Coimbra. 


Na República,  os imigrantes ficavam ricos, os árabes na Rua 25 de Marco em São Paulo, na Rua da Alfândega no Rio de Janeiro e os judeus no Bom Retiro em Sao Paulo. Mas não foram sucedidos pelos descendentes. Estes foram direcionados a um título de doutor. Hoje suas regiões da cidade estão ocupadas pelos chineses e coreanos, os novos imigrantes -  que certamente farão filhos doutores, que   abandonarão as profissões dos pais


O elitismo é da natureza humana, mas é muito acentuada no Brasil.  O tratamento “Senhor Doutor”  incorporou-se nos usos e costumes  da gente brasileira. A ponto de receber o tratamento de qualquer cidadão visto como dotado de alguma posição na sociedade. A par do “doutor” tivemos a fase do “comendador” -  título comercializado espertamente pelo Vaticano, que os “concedia”.


Perdemos com esse elitismo, um uso melhor do ensino médio profissionalizante. Como não competem em status com as faculdades, não têm o mesmo apelo. O ensino profissionalizante, que em poucos meses forma bons profissionais, são econômicos: custam pouco dinheiro e dão resultado a curto prazo. Uma política educacional realmente voltada à classe média incentiva as escolas profissionalizantes. As faculdades deveriam existir para formar uma elite e não ser ambição de todos. Afinal uma tribo não deve ter mais caciques do que índios — que é o que parece pretender as nossas políticas educacionais. Elas, as escolas profissionalizantes, são a melhor e mais econômica política de redução das desigualdades econômicas existente.


Com tantas faculdades de direito há algo de podre no Brasil. E, como Hamlet,  nós nos alienamos  para sobreviver.


São Paulo, 11 de outubro de 2022


Nota

Ler o artigo A eficiência da justiça brasileira, jornal O Estado de São Paulo, pág. A4 de 17de outubro de 2.022.

terça-feira, 27 de dezembro de 2022

                           O BEIJO DA MORTE.


Se meus braços nada mais querem abraçar,

As minhas pernas não mais querem caminhar,

A  minha alma não pode mais querer amar,

As ilusões não querem mais  me enganar,

A glória não mais me faz sonhar,

A vaidade não mais me vai influenciar,

A esperança acaba de me abandonar,

Se falta-me vontade do mundo desbravar,

Estou caminhando  para a morte beijar.



Se  somos  como gotas d’água a rolar, 

Descendo, crescendo,  até molhar

As margens do rio que  puder  alagar; 

Abraçando ilhas que puder criar, 

Ampliando os seus braços sem parar,

Ambicionando o mundo inundar, 

Para ser engolido no final pelo  mar,

Fica sem sentido pela vida lutar,

Pois terminamos pela morte beijar.


Se quando nada mais me restar,

A não ser o corpo a doer e cansar,

A mente a não mais querer pensar,

A forte vontade se  abrandar,

A doce ilusão me abandonar

E a última esperança acabar

Sem ter um futuro a visualizar ,

Posso começar a me preparar —

A minha  missão na Terra vai terminar,

Sentirei  o beijo da morte a me beijar.


São Paulo, 23 de dezembro de 2022.

Jorge Wilson Simeira Jacob

sexta-feira, 23 de dezembro de 2022

 OS PRECONCEITOS. 



“Quem não for preconceituoso que levante a mão!”. Se esta proposta for levada a efeito para um grupo de pessoas, concientes e sinceras, nenhuma mão será levantada. Todos estamos carregados de preconceitos de variadas espécies. Uns de um tipo, outros de outro. Temos uma variedade de  preconceitos: uns não gostam da cor da pele, tem aversão aos pretos ou  amarelos;  outros da religião, tem restrições aos dmuçulmanos, aos judeus ; e alguns subestimam   os latinos e os orientais. Sem falar do preconceito econômico — pobres  contra a riqueza  e  vice versa. E por aí vão as nossas idiossincrasias . Temos conceitos preestabelecidos (preconceitos) de quase tudo e de quase  todos. A verdade  é que o animal humano é na sua natureza essencialmente preconceituoso. 


Esse  só não é transparente por ser um dos sentimentos  que mais disfarçamos. Os preconceitos são considerados politicamente incorretos -  principalmente o preconceito racial, que é crime no Brasil. Julgar  uma pessoa por sua cor, origem ou crença, como não é socialmente aceito, só na intimidade o admitimos. Assumir em  publico o preconceito racial  é uma raridade. Ele existe, mas não é reconhecido. A sociedade brasileira ufana-se de não ter preconceito racial. Gostamos de ser vistos como um exemplo de miscigenação bem sucedida. O que em termos relativos é uma verdade.


Há porém que se fazer distinção entre as diversas facetas dos preconceitos. Nem todos são negativos. Por exemplo, baixamos a guarda no contato com  uma pessoa civilizada, que transmite confiança; ou colocamos um pé atrás com um indivíduo de má aparência e mal encarado. São ações motivadas por preconceitos adquiridos pela experiência ou educação. Nem sempre acertamos com base no preconceito. Ele  não garante o resultado, mas é a nossa primeira reação .


O preconceito torna-se odioso quando julgamos um indivíduo não pelos seus méritos, o que exige conhecimento da pessoa, mas pela imagem da coletividade a que pertence. Em todos os grupos sociais há os bons e os maus exemplos. São os racistas  que, para indicar uma excessão à regra, reconhecem existir o “ preto de alma branca”. Mas nem por isto  deixam de generalizar. O mal do preconceito está na padronização, na não individualização. O desafio está na racionalidade de respeitar a individualidade de cada um independente do grupo a que pertence.


As razões para o desenvolvimento do preconceito são as mais variadas. Algumas até bem fundamentadas. Geralmente são causadas por inveja, competição e estágios de civilização. Nenhuma coletividade está livre dos preconceitos. Nós temos, por preconceito, o costume de avaliar:  - os anglo-saxões como frios, indiferentes ao amor familiar;  os muçulmanos como fanáticos que desejam doutrinar o mundo; e  os africanos como sub proteicos. E os civilizados  nos veem  como sensuais, emotivos e dependentes da família. Todas estas avaliações são baseadas em alguns exemplos vivenciados  ou  relatados. Um caso marcante foi de uma amiga americana, professora universitária, que conhecia bem o Brasil, e tinha um forte preconceito contra a mulher brasileira. Considerava-as todas promíscuas. Formou essa opinião em alguns casos que conhecia e das cenas televisionadas do Carnaval Carioca.



O preconceito enquanto um sentimento individual pode ser compreendido. Torna-se, porém , insuportável quando leva a sociedade à discriminação. O Brasil, depois da libertação dos escravos, ainda que preconceituoso, nunca criou leis discriminando nenhuma raça ou religião. Nunca tivemos banheiros, escolas, ônibus separadas pela cor da pele. E nem sombra de uma Ku Klus Kan. Ainda que existam entidades sociais que não os aceitem  como sócios, mas fazem excessão desde que sejam   ricos e/ou importantes. Seria este um preconceito econômico?


O preconceito pode passar desapercebido. Já  a discriminação machuca por ser declarada. As vítimas da discriminação necessitam de nível elevado de  isenção de ânimo para superar um sentimento de recalque. O normal é uma revolta íntima contra os seus desiguais, o que acontece nos Estados Unidos - onde a discriminação fez história . Por humanidade e por espírito prático a discriminação é um  mal a ser combatido.


O preconceito é do ser humano. A discriminação é dos desumanos.



São Paulo, 27 de setembro de 2.022.


sexta-feira, 16 de dezembro de 2022

 A REVOLUÇÃO ESQUECIDA.



No inconsciente popular a palavra revolução traz a imagem de luta armada. Na verdade, a interpretação correta  é a de ser  uma revolução um momento de  ruptura , com ou sem luta armada, da  ordem social e política que estaria em vigor até à sua manifestação. Assim foi a revolução militar de 1964, que derrubou o governo João Goulart. Houve, sem derramar sangue, a troca do poder político, que passou às mãos dos militares.


Essa é uma revolução conhecida. Entretanto, outra  aconteceu paralelamente— uma revolução esquecida — a revolução econômica do país. Olhando em perspectiva, com o governo Castelo Branco, o Brasil mudou de patamar. Antes dele o país era política e economicamente atrasado em relação ao mundo. A nossa economia era anêmica. Dependíamos das importações, a nossa indústria era incipiente , e  como receita de exportação dependíamos basicamente do café . Nossas exportações  eram  de pouco mais de 1bilhao de dólares para uma população de 40 milhões de habitantes — 70% na zona rural.


A situação era precária e as tendências eram desfavoráveis ao desenvolvimento. O  governo de terra arrasada do desastrado Presidente João Goulart culminou, com a submissão aos sindicatos dos trabalhadores,  a inviabilizar a  nossa economia .  As  taxas de crescimento, chegaram a  apenas 0,6% de crescimento em 1963.A    falta  de investimentos públicos e privados; a  elevação do déficit público; e uma  inflação, que em 1961 era de 51,6% e passa a 80% em 1962, chegando a 93% em 1963...mostravam o caminho de uma hiperinflação.Tudo isso levou a uma crise interna e externa. Não havia dinheiro para custear a máquina pública e nem  para atender às necessidades das importações. 


Se na área política,  a revolução de 64 , com a troca de governo, é sobejamente conhecida  — inclusive tendo sido criticada e contestada, o mesmo não é válido para o que aconteceu com a economia. Nela   não se reconhece a modernização  acontecida. Foi uma revolução ignorada. A inflação foi contida, os gastos públicos controlados, o sistema telefônico e de energia elétrica, praticamente falidos,  foram modernizados e ampliados. Além de que dois entraves,  ao investimento privado,  herança do populismo getulista, foram afastados: a Lei da Estabilidade no Emprego e o Imposto Causa Mortis.


A Lei da Estabilidade, determinava que após 10 anos , o empregado adquiria estabilidade. Não podia ser demitido nem por justa causa. As consequências eram, no primeiro momento, a perda da disciplina e interesse pelo trabalho. A direção da empresa não tinha poder de exigir empenho e seriedade nas tarefas. A experiência levou a que, ao completar 9 anos, os funcionários fossem  demitidos. Com isto desperdiçava-se a economia do trabalho especializado e desestimulava o investimento em treinamento. Todos saiam perdendo. A “revolução” aconteceu ao trocar a dita estabilidade, que tinha deixado de existir na prática, pelo Fundo de Garantia de Tempo de Serviço — FGTS. Um depósito mensal pelos empregadores em conta dos empregado, que propiciou recursos para o financiamento da casa própria, além de assegurar indenizações em casos de dispensa do emprego.            


A outra “revolução” foi o cancelamento do Imposto Causa Mortis *, que  era na verdade um imposto sobre as heranças. Os percentuais, (se não me falha a memória) , iam até 36% do patrimônio a ser distribuído. As distorções provocadas eram significativas e os resultados na arrecadação insignificantes. Era uma dupla tributação, pois os bens já tinham sido taxados na sua geração. A sua execução era complicada, pois , geralmente , os herdeiros recebiam um patrimônio, mas não tinham liquidez para recolher os impostos. Empresas e propriedades  tinham que ser liquidadas para atender ao fisco. Além de que  os proprietários, temerosos da tributação, desviavam os seus rendimentos fora do alcance do fisco, com forte distorção na alocação dos investimentos. A Suécia, como exemplo,  diante dos inconvenientes, decidiu abolir o imposto de herança sob o principal argumento de que representava um empecilho para a manutenção de empreendimentos familiares.


O imposto sobre a herança é um confisco . É uma violência a um dos três direitos fundamentais do homem: o direito à vida; à liberdade ; e o direito à propriedade privada. É sobretudo a violação da condição básica para a liberdade individual. Por ser  o reconhecimento da propriedade privada, o que permite ao indivíduo  agir conforme a sua própria determinação por ter o suporte do controle de alguns bens materiais.


Os três anos do  governo Castelo Branco  foram marcados por uma revolução nos usos e costumes, como se começasse tudo de novo. Um governo marcado pela moralidade, pela austeridade; pelo combate à demagogia e à corrupção; pela racionalidade econômica; cujo resultado, mesmo lutando com uma situação adversa herdada ( um verdadeiro caos ) ,  foi  um crescimento de 12,6% do PIB (média de 4,2%) e a redução da inflação em 92,12 para 25,01%.O Brasil moderno  muito deve à “revolução esquecida”  do Presidente Castelo Branco. Um estadista a não ser esquecido!



  • O imposto foi restabelecido na Constituição de 1988, com alíquotas limitadas a 8%.

São Paulo, 14.12.2022.

Jorge Wilson Simeira Jacob


sexta-feira, 9 de dezembro de 2022

 A LUTA DA INVEJA CONTRA O EGOÍSMO.



O  Criador, segundo a Bíblia, expulsou  Adão e Eva do Paraíso, pelo pecado original,  condenando-os a amassar o pão com o suor das suas testas. Esta  condenação estabeleceu a primeira das  desigualdades entre os homens:  os que têm que suar as testas para comer o pão e os que morreriam de fome. 


A partir daí nunca mais os homens tiveram  igualdade na partilha dos  bens terrestres. O esquema  funcionou pacificamente enquanto a humanidade resumia-se a um  restrito núcleo familiar, uma organização que pratica o ideal comunista de dar:  - a cada um de acordo com as suas necessidades e de cada um das suas possibilidades. Mesmo assim,  não impediu a  rebeldia  de Abel matando  Caim, seu irmão. Este evento,  de pura inveja,  marca o início das demonstrações de insatisfação com a desigualdade.


Na história de Roma os irmãos Graco *  foram assassinados por suas propostas de redução das desigualdades econômicas dos plebeus.  Não só em Roma, mas em toda a  humanidade  a desigualdade nunca deixou de incomodar. Só não foram às últimas consequências por terem sido desestimuladas pela pregação: -  do cristianismo, no Ocidente, que promete que os céus serão dos humildes; -  e das tiranias do Oriente, que sufocavam as vontades pela força. 


Na Índia, a maior democracia do mundo, as aspirações são contidas  pela religião  e pela divisão da sociedade  por castas. Com estes instrumentos de dominação, os desfavorecidos  são contidos pela resignação e pelo fervor religioso .  Recentemente, no  século 18,  surge  a ideologia socialista baseada na luta de classes. Segundo esta concepção, uma ação política faria uma justiça social distribuindo os frutos independentemente do suor derramado.


  Esse discurso pôs  calor no debate entre a inveja e o egoísmo. Uns cobiçando o que não lhe pertence e outros recusando-se  a   abrir mão das suas conquistas. Uma  disputa que pode ser classificada como a  luta do capitalismo versus o socialismo ou  do egoísmo versus a inveja. 


A democracia americana inovou com o  voto universal.  Deu poder político às massas, que pressionam os governos a redistribuir as rendas, tributando quem tem para transferir aos outros. Os governos, com vistas aos votos da maioria,  para aplacar os apetites, alargam a sua ação intervencionista . A consequência foi o incessante crescimento da máquina governamental, cuja degeneração e corrupção  é correspondente. Como viciado, que um gole, em vez de saciar a sede, pede outro, assim são as expectativas populares e o crescimento da avidez da burocracia ** . 


Porém, como  na Física  a Economia também  tem limites. Nesta apresenta-se  no esgotamento da capacidade contributiva dos cidadãos. Como os recursos são sempre inferiores às necessidades, chega-se  a uma situação de atrito  entre a inveja e o egoísmo, entre o  “ nós e eles”, tão bem explorado pelos demagogos.





Há, porém, uma distinção a ser feita: - onde o tributo arrecadado retorna em benefícios ao povo e , onde, não retornam,  são gastos com a máquina pública. Quando o produto da arrecadação retorna em serviços e benefícios aos cidadãos, há uma redução na desigualdade; mas se a  máquina governamental esteriliza os recursos arrecadados em sua manutenção, há o aumento da desigualdade. De onde conclui-se ser o governo perdulário, burocrático, o maior  responsável pelas desigualdades.

 

A desejada melhoria das condições dos menos favorecidos  deve começar pelo melhor cuidado com aquilo em que todos são iguais. Somos todos igualados, independente da  situação sócio-econômica,   no uso  dos bens fundamentais : Segurança, Justiça, Soberania Nacional, Educação e Higiene. Somos  também nos bens de uso comum: na qualidade da água, do ar, das vias públicas, comunicação , mobilidade… 


Somos, ricos e pobres, desiguais  é nos consumo dos bens conspícuos: carros e restaurantes de luxo, aviões particulares, iates, as grifes…  Aceita esta divisão entre os diversos bens ( fundamentais e conspícuos) , um processo de redução da desigualdade deve  começar pelo governo cuidando dos bens fundamentais e deixando os não fundamentais por conta da sociedade. 


Assim , o governo melhoraria  a vida de todos naquilo em que estamos igualados, que é o fundamental para a qualidade de vida e deixando  a

as desigualdades  entre os Abeis  e os Caims  limitada aos bens  conspícuos, que segundo a Bíblia devem ser conquistados com o suor de cada um.


  • Os irmãos Graco são conhecidos reformadores romanos que tentaram realizar a reforma agrária e outros tipos de reformas em benefício dos pobres. Ambos, chamados Tibério e Caio, foram eleitos tribunos da plebe e acabaram sendo vítimas dos senadores insatisfeitos com as medidas defendidas por eles.

** bur(r)ocracia brasileira - a máquina do governo, entre arrecadação, inflação e endividamento, esteriliza perto de cinquenta por cento do que é produzido no Brasil, pelo péssimo retorno nos bens essências. Não só administra mal  como dificulta a vida de quem quer trabalhar. A bur(r)ocracia produz 700 regras tributárias por dia, como obstáculos à produção, desde 88 até 2017 produziu 5 milhões de normas tributárias, colocando o país na posição 184 entre os 190 piores países para pagar impostos. O resultado é  maior contencioso fiscal do mundo - 5 trilhões de reais. 



São Paulo, 26 de junho de 2021.

Jorge Wilson Simeira Jacob


Texto publicado no Jornal Opçāo

Coluna Contradiçāo.


Este blogue respeita o seu tempo. Por favor, caso não tenha interesse em receber estas reflexões, solicite a exclusão pelo e-mail jwsjbr@gmail.com . Basta digitar a palavra NÃO. 



quarta-feira, 7 de dezembro de 2022

 O DESERTO DOS TÁRTAROS 


Edição Amazon - português

Dino Buzzati

176 páginas - R$27,99




O Deserto Dos Tártaros é a obra-prima de Dino Buzzati. Publicado originalmente em 1940, o livro marcou a consagração do autor entre os grandes nomes da literatura italiana e foi eleito pela crítica especializada um dos melhores livros do século XX. O texto foi adaptado ao cinema e ao teatro também com grande aceitação.



A obra narra a história do jovem tenente Giovanni Drogo, que recebe com alegria uma missão no Forte Bastiani,   a primeira etapa de uma carreira gloriosa. Embora não pretendesse ficar por muito tempo, o oficial de repente se dá conta de que os anos se passaram enquanto, quase sem perceber, ele e seus companheiros alimentavam a expectativa de uma invasão estrangeira que nunca acontece. A espera pelo inimigo transforma-se em razão de viver, na renúncia da juventude e na mistura de fantasia e realidade. “O tempo passou tão velozmente que nem deu tempo de envelhecer”.

 



A leitura é leve e despretenciosa, mais para o estilo jornalístico do que erudito. Buzzati recusava ser qualificado como escritor. Fez toda a sua história como jornalista no Corriere Della Serra . O que se nota na linguagem simples, sem abusos  de metáforas e  figuras de linguagem. A sua redação é límpida e acessível. Poucas são as expressões poéticas no texto. Entretanto, principalmente nas primeiras cem páginas, o autor descreve com riqueza de detalhes não só os personagens como as situações que retrata. Neste trecho o enredo não causa emoção. Mas cria ambiente para um desenrolar que sensibiliza o leitor.  


É uma história como todas as histórias humanas: a busca do significado da vida. Giovanni  é só mais uma das vítimas da impotência humana. Vive um sonho que a realidade não valida . Só os que viveram uma longa vida podem ter na mesma intensidade a  sensibilidade para apreciar a frustração humana vivenciada por ele.  Desde o reencontro com um amor da juventude, em que o tempo distante esfriou,  até o calor da casa materna, tudo conspirava contra a realização do seu sonho. Como ele constata: - “ O tempo entretanto passa a correr, a sua batida silenciosa marca, cada vez mais apressada, o ritmo da vida; não é possível parar nem por um instante, nem para olhar para trás “.


O autor trama um enredo com habilidade. Consegue envolver o leitor ao fazê-lo  identificar-se com  a vida do personagem. E aí está a sua arte, pois nos emociona. É um texto que  mostra a pura realidade de que não “ levamos a vida, mas que é  ela que nos leva”. Nenhum projeto de Giovanni realizou-se. Poucos são os nossos projetos que se tornam realidade. À espera pelo inimigo transforma-se  na angustiante espera por uma razão de  viver, na renúncia da juventude e na mistura de fantasia e realidade.


A literatura é uma arte que  entretém e ao mesmo tempo nos ilumina através da emoção. Somos receptivos aos apelos racionais, mas muito mais abertos às emoções. A emoção quebra as nossas barreiras. Ao sentir as decepções de um personagem bem “ criado “ pelo autor,  nos identificamos e colocamo-nos ao seu lado. Ao final desta leitura, estabelecemos um laço  entre nós e o Giovanni. Sentimos as suas dores e o seu lamento pela perda do significado da vida. 



São Paulo, 06.12.2022

Jorge Wilson Simeira Jacob



Publicado no Jornal Opçāo 

Caderno Cultural


sexta-feira, 2 de dezembro de 2022

 




A LIBERDADE OU A SERVIDÃO !


Em 1º de outubro de 1949, Mao Tsé-tung apareceu triunfante na Praça da Paz Celestial, em Pequim, para proclamar a República Popular da China. Para a ocasião – que viria a transformar as vidas de milhões de pessoas –, o "Grande Líder" usou uma túnica folgada abotoada até a gola, de colarinho alto. A roupa virou símbolo do comunismo chinês e encantou o mundo da moda.


Essa vestimenta fez parte de  uma série de medidas adotadas para eliminar as desigualdades de classes. Fiel aos ideais da revolução comunista, Mao determinou como padrão  esse  modelo de roupa único no modelo e na cor. Ninguém mais seria diferente! Além de eliminar o individualismo - “um mal do capitalismo” - racionalizava a produção reduzindo os custos de produção, armazenagem e distribuição. Assim, todos  estariam coletivamente padronizados. Todos vestiriam túnicas cinza. Um exército de zumbis.


O modelo Mao fez moda. Jânio Quadros ( 1 961 ) , então presidente do Brasil, entrou na onda. Lançou a moda no Brasil. Mas como todos os modismos, a moda durou pouco… aqui e na China. Lá , as pessoas, tolhidas na liberdade para escolher,  faziam alterações nas roupas vendidas pelo partido. Uns estampavam desenhos. Outros frisos coloridos. O limite era a imaginação . Todos fugindo da uniformidade para diferenciar-se. A natureza humana não se realiza no anonimato. O ideal  humano busca destacar-se pela desigualdade. A padronização social violenta a nossa índole.  


A felicidade, que é na última instância, o desiderato de todo ser normal, é obtida de forma diferenciada. Uns abandonam uma casa rica para viver um grande amor na pobreza. Enquanto outros casam pela riqueza, ignorando o amor. As buscas da felicidade são tão infinitas quanto são as cabeças humanas. O que explica os fracassos das políticas que tolhem a liberdade individual. A igualdade imposta  só sobrevive nos regimes de força. Na liberdade os homens querem diferenciar-se destacando-se social, profissional ou intelectualmente. Um comerciante  destaca-se  fazendo fortuna. Um intelectual dando aulas e escrevendo livros. Nenhum dos dois ficaria feliz na posição do outro. Ainda que o comerciante cobice o prestígio do intelectual, e este a riqueza do comerciante.


O  poder econômico é um forte fator de diferenciação . De muitas  formas provoca  segregação. O que resulta  na   distinção entre os bairros nobres e os pobres. Uma  separação baseada nas condições econômicas.  Mas acontece, também, nas áreas livres, onde não existe a limitação da riqueza. As nossas praias e lugares públicos  são de uso comum e indiscriminado, mas as pessoas agrupam-se próximas dos que se aproximam dos  seus padrões sócio-econômico-civilizatórios. Sem que ninguém estabeleça a separação, acontece uma segregação espontânea. Ninguém a determina.  É socialmente natural. Os indivíduos sentem-se desconfortáveis , como peixe fora d’água, se não tem identidade com o ambiente em que estão. Procuramos estar entre os nossos iguais. Entre eles lutamos pela  diferenciação. Se ascendemos à uma classe superior, estaremos lá   com vistas a nos diferenciar novamente.


Somos, como sociologicamente nos classificam, seres gregários. Necessitamos de companhia não só para ser feliz, mas também para sobreviver. Na prática, porém, somos socialmente seletivos. Somos seletivamente gregários. E as razões para a escolha dos grupos sociais são inúmeras. Quando existe a liberdade para escolher: - os fúteis,  os racionais, os broncos, os civilizados preferem os seus iguais. Mas, situados  entre os seus,  todos buscam a diferenciação. Um pistoleiro, ao menos nos filmes de faroeste, quer ser mais rápido no gatilho do que os seus rivais. Ser mais rápido é a sua diferenciação. É a sua razão para ser feliz!


Mao tse Tung, como todos os socialistas, fracassaram  na tentativa de coletivização por acreditar que as pessoas podem ser tratadas como robôs. O ser humano diferencia-se por ter sentimentos e emoções . Nem somos máquinas nem somente razão . Além da razão, temos sentimentos e emoções - o que nos faz diferentes, únicos . Não fomos desenvolvidos para sermos padronizados. Mas para sermos indivíduos autônomos . Isto está na raiz da luta do individualista. No nosso DNA vem gravado: a liberdade ou a servidão!



São Paulo, 13 de setembro de 2022