quinta-feira, 30 de junho de 2022

 O ETERNO PAÍS DO FUTURO.


Brasil, País do Futuro

Stefan Zweig

Editora Civilização Brasileira, 264 páginas.


Brasil, Eterno País do Futuro.

Alberto Ravizzoli

Editora Createspace, 496 páginas.



Stefan Zweig , da década de 1920 e até sua morte, foi um dos escritores mais famosos e vendidos do mundo. Suicidou-se durante seu exílio no Brasil, deprimido com a expansão da barbárie nazista pela Europa, durante a Segunda Guerra Mundial. Fugiu do nazismo  mudando-se para Petrópolis. Aqui foi recebido com entusiasmo tanto pela comunidade intelectual local quanto pelas autoridades políticas. Para os intelectuais brasileiros, a presença de tão renomado escritor em terras nacionais trazia prestígio e oportunidades de um intercâmbio com outros escritores estrangeiros.


Zweig era um apaixonado pelo Brasil, que o acolheu em um momento difícil da sua vida. Passou pela Inglaterra e Estados Unidos, mas fixou residência em Petrópolis, onde a sua antiga residência é aberta à visitação pública. Na sua despedida, antes do suicídio, ele deixou escrito: “Cada dia eu aprendi a amar mais este país e não gostaria de ter que reconstruir minha vida em outro lugar depois que o mundo da minha própria língua se afundou e se perdeu para mim, e minha pátria espiritual, a Europa, destruiu a si própria”. 


Nos idos dos anos quarenta ( 1941 ), Stefan Zweig escreve o clássico Brasil, Um País do Futuro, a pedido do ditador Getúlio Vargas.  Aproveitando-se da oportunidade, desejando promover o Brasil, encomenda  a Zweig um livro laudatório ao país. O livro foi lido mundo a fora , foi considerado ufanista demais, mas deu o slogan nacional. Desde então, nós brasileiros estamos aguardando a promessa realizar-se. Os inconformados, conscientes do potencial brasileiro, não aceitam calados o Brasil não estar situado  no topo das nações mais desenvolvidas. Quase um século passado da previsão otimista de Zweig,  como  marco civilizatório, o país avançou pouco.




A gente brasileira.


A sua sensibilidade de escritor captou o caráter da gente, que o encantou. Não deixando, entretanto,  de enaltecer  a beleza e a riqueza da terra. Não faltam no livro análises sobre a cordialidade dos locais, que ele certamente confronta com os da sua origem. O que ele expressa neste trecho do livro:  “ Agora se sabe por que a alma fica tão aliviada logo que pisamos nesta terra. No primeiro momento tem-se a impressão de que esse efeito libertador e calmante é apenas uma alegria para os olhos, uma absorção feliz daquela beleza única que acolhe o recém-chegado com os braços bem abertos. Logo, no entanto, reconhecemos que essa disposição harmônica da natureza aqui passou a ser o modo de vida de uma nação inteira. Algo de inverossímil e de benfazejo envolve aquele que acabou de fugir da absurda loucura da Europa: a total ausência de qualquer hostilidade na vida pública e na privada. [...] Todas as contradições, mesmo no campo social, são significativamente menos acentuadas e, sobretudo, menos envenenadas. A política, com todas as suas perfídias, ainda não é o eixo da vida privada nem o centro de todo o pensar e sentir. Logo que se chega ao país, a primeira surpresa, que se renova diariamente de maneira feliz, é descobrir a maneira gentil e pouco fanática com que as pessoas convivem naquele espaço imenso”.


Por que as previsões do Zweig, passados quase um século não se realizaram?



Alberto Ravizzoli, em texto mais recente, Brasil, O Eterno País do Futuro, prometia ser uma resposta aos inconformados. Ravizzoli é ponderado ao alertar de que a par das nossas mazelas temos virtudes e qualidades que ensejam oportunidades. Entre as nossas desvantagens está o patrimonialismo: “ os empregos públicos são a grande moeda de troca nos conchavos políticos. O governo americano tem 8.000 cargos de confiança, a França, 4.000, a Inglaterra 300… e nós temos 26.000 dirigentes indicados politicamente para mais de 1 milhão de funcionários concursados. O Brasil mantém uma das mais complexas estruturas burocráticas do mundo. Em matéria de complexidade e ineficiência perdemos para o Paraguai e Ruanda. O sistema tributário é péssimo. Entre 1988 e 2012, foram editadas mais de 290.000 normas tributárias - cerca de 30 por dia.A Justiça do Trabalho conta com 41.000 servidores, custou  11 bilhões de reais em 2011 aos cofres públicos. 

Esses e outros problemas fazem necessário cinco trabalhadores brasileiros para produzir o equivalente a um americano”.


A questão racial.


Um capítulo dos mais interessantes é o que analisa a questão racial.Segundo  Ravizzoli, temos a vantagem de nunca termos tido  um regime jurídico de segregação da população negra, o que nos fez uma democracia racial. O nosso problema não é o racismo, mas sim a pobreza, e as desigualdades não são raciais, mas são sociais. Temos sim uma sociedade dividida, não igual, onde um garoto negro tem mais chances de morrer de forma violenta e ter menores salários no mercado de trabalho do que um branco.


Questão Social e Questão Racial.


Não se pode prescindir de dois aspectos singulares para compreender o Brasil: o preconceito de classe e o preconceito racial. A questão social atravessa a nossa história como fruto das desigualdades econômicas, políticas e culturais. Apesar do preconceito e discriminação racial não serem exatamente a mesma coisa, são práticas frequentemente associadas como irmãs gêmeas do racismo. 


O Brasil é apontado alhures como terra da miscigenação, tolerância e igualdade racial. A ilusão de uma democracia racial faz, sem dúvida, confundir uma realidade complexa, na qual o preconceito se pratica, mas não se assume. Há todavia, um tipo de problema que a experiência histórica  do Brasil praticamente desconhece: a cultura do ódio racial, exemplificado na Ku Klux Klan. 


Ainda que tenhamos a segunda maior população negra do mundo, mas a condição existente do mulato funcionou como uma válvula de mobilidade social de onde advieram dois resultados: dividiram o que poderia ser uma comunidade negra unida por um destino político comum e esvaziaram as possibilidades de conflito racial. Outro fator que dificultou à emergência de um discurso de mobilização racial foi a não legalização , ou a não formalização, do racismo.


Política e Poder. A ilusão democrática.


O autor aborda extensamente a organização politica- partidária do Brasil. Se na parte dedicada à sociologia há boas análises críticas até originais, na descrição da política deixa a desejar. Vale como um arquivo didático , mas pouco criativo.


O teorema de Tom.


O escândalo da contabilidade criativa, que o autor correlaciona com a Teoria de Tom, refere-se ao desastroso governo Dilma Rousseff, que maquiou as contas públicas. Essa expressão é atribuída ao compositor Tom Jobim, que costumava dizer que “ o Brasil não é para amadores”. Ele referia-se a facetas dos usos e costumes nacionais, como: as leis que pegam, o que parece ser mas não é, e o vice-versa.



Custo Brasil: a ineficiência da logística 


Como consequência da má administração pública e de um Estado  disfuncional, o custo Brasil impede o desenvolvimento. O autor não é conclusivo. Aponta as diversas facetas, favoráveis e desfavoráveis para a paz social e o desenvolvimento, mas não assume uma posição. O que seria fácil concentrando o foco nos efeitos da gestão pública: um Custo Brasil que empobrece a população por encarecer a vida e impedir a competitividade internacional do País.


Vejamos alguns dados do último capítulo:

 - o Brasil ocupa a 104* lugar no item “Qualidade da Infraestrutura “;

 - a malha ferroviária é oito vezes menor do que a americana;

 - a malha pavimentada é 20 vezes menor do que USA e   da Índia, proporcionalmente.

 - os portos são poucos e congestionados;

 - as frequentes greves do fiscais da Receita Federal  nos portos e aeroportos dão insegurança operacional

 - o transporte de 1 tonelada de grãos por caminhão ( 1.600 Kms ) é de US$ 145 no Brasil; US $36 na Argentina e menos de US $25 nos EUA.


Segundo a Fundação Dom Cabral de 2013, as perdas das empresas com a logística no Brasil é estimada em 4% do PIB.


Este livro é um convite aos inconformados para entender o por que fizemos deste território imenso e rico, habitado por uma gente cordial, o Eterno País do Futuro.


São Paulo, 26 de junho, 2022.

Jorge Wilson Simeira Jacob


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