domingo, 30 de junho de 2024

 Os egos nas nuvens


Quanto mais  mais baixo o status social  ou mais frágil psicologicamente é uma pessoa  mais influenciável ela é à posição de autoridade. Uma criança com poder de controlar uma roda gigante em um parque de diversões é extremamente rigorosa no número de voltas que o equipamento dá. Um guarda de trânsito, de nível social inferior, tende a ser muito rigoroso com os infratores. 


Ilustrativo desse comportamento é um “ caso “ ocorrido em um quartel. Um general chegando cedo ao serviço é abordado por um recruta : “ por favor, dá um fogo aí? Estou louco para fumar o meu cigarro”. Ato contínuo o general acendeu o isqueiro e o ofereceu ao recruta. Este acendeu o cigarro e agradeceu: “ obrigado general”


O oficial, guardando o isqueiro no bolso, olhou com firmeza para o recruta: “ moço, vou  dar-lhe  um conselho. Não se atreva a pedir fogo para um sargento. Você iria para o xilindró — sem sombra de dúvidas.”


Em teoria, as pessoas de  nível  inferior se realizam em posição de poder. Há que se ter cuidado em situações em que um indivíduo detém uma posição de poder superior ao seu nível.  O poder tem efeito inquestionável na psicologia das pessoas. Raros são os que em posições de mando não se deixam contaminar.


Não faltam casos a demonstrar a existência do uso e abuso da autoridade. Um comissário de bordo em pleno voo serve um lanche a um passageiro da primeira classe. Este solicita ao comissário que lhe servisse mais manteiga. Ante a recusa, o passageiro retruca: “ estou na primeira classe e tenho direito à um tratamento diferenciado”. Nova recusa. Diz o passageiro: “ eu sou senador da república”. Nova recusa. 


O senador impacientando-se com a obstinação do funcionário, com voz exaltada: “ sou o maior acionista desta companhia aérea. Exijo mais manteiga. Quem você pensa que você é?”  Ao que o comissário responde: “ eu sou o dono da manteiga!”. E não serviu o senador. Assunto encerrado.


Portanto, é prudente identificarmos  os donos da manteiga para não nos decepcionarmos nos nossos relacionamentos. Peça fogo a um general, mas não peça manteiga a quem detém uma autoridade superior ao seu status. Eles são perigosos.


Em uma empresa privada, os responsáveis constataram que os melhores guardas de segurança eram os indivíduos de baixo QI ou nível social. Eram os mais rigorosos no cumprimento das ordens de segurança. Os melhores dotados tendiam a fazer concessões ou exceções.  Eles não necessitam de mostrar  autoridade para se realizar.


Se a polícia também constatou que o mais rigoroso zelador da ordem pública são os menos dotados e só os contrata, a sociedade corre um risco ao ter uma tropa na rua com  revólver e cacetete. 


Consciente do risco, tive a seguinte experiência.Fui abordado no trânsito. Soprei no bafômetro. Por solicitação do guarda, sai do carro, coloquei as mãos na parede de um murro para ser revistado se portava armas. Olhei para o policial e ,tendo presente estar ele exercitando a sua  autoridade, fiz mansamente tudo o que ele me mandou. Obedeci mesmo na condição de um idoso que não apresenta o mínimo risco de algum ato violento. Mas ele cumpria rigorosamente as instruções recebidas. E no seu semblante estava visível que o seu ego foi às nuvens. E eu não deixei por menos — frágil como sou senti-me lisongeado por ser visto como um perigo para a sociedade. Meu ego também foi ás nuvens.


São Paulo, 22 de março de 2024.

Jorge Wilson Simeira Jacob


domingo, 23 de junho de 2024

 A jornada da humanidade.


A humanidade vem prosperando desde o seu surgimento na África há milhares de anos, mas muito lentamente. Só há  duzentos anos atrás abandonamos o estado de  estagnação econômica. Seguia-se, até então , a prescrição malthusiana de que à  cada evolução da produção de alimentos seguia-se um crescimento populacional que inviabiliza o ganho per capita da população. O que Malthus classificou como a armadilha da pobreza.


À cada revolução tecnológica que melhorava a produtividade se seguia um aumento populacional que anulava este ganho. Só durante a Revolução Industrial com a liberação da mão de obra infantil para o estudo e o decréscimo da fecundidade houve o enriquecimento da população, mas mantendo  desigualdade entre pessoas e regiões.


Foi há  duzentos anos com a Revolução Industrial que a  ideia da especialização no trabalho de Adam Smith dá início a um enriquecimento de algumas regiões do mundo. O porquê do progresso e a razão de umas regiões beneficiaram-se mais do que as outras é motivo do livro de Oded Galor ( Ed. Intrinsica, Amazon $39,25 , 339 pág) A jornada da humanidade.


Oded Galor é um economista israelense-americano nascido em 1953. Professor de economia na Brown University. Recebeu o título de Doutor Honório Causa da UC Louvain e da Poznán University of Economics & Business, entre outras participações. É considerado o criador da teoria unificada do crescimento econômico. Também é co-diretor do National Bureau of Economic Research sobre Distribuição de Renda e Macroeconomia. Escreve no Journal of Economic Growth e  no Journal of Population Economics e Macroeconomic Dinamics. Não lhe faltando títulos para recomendar ser lido no seu livro A jornada da humanidade, aqui resenhado.


O texto,  sem as  sofisticações do economês, corre em uma leitura muito acessível. Vai desde o início da humanidade até os dias atuais. A exposição é bastante didática e lógica. A humanidade superou nos últimos duzentos anos a estagnação quando  melhorou a produtividade permitindo transferir trabalhadores das atividades da  agricultura e do trabalho braçal repetitivo  para outras nas cidades que propiciavam salários mais elevados. 


Odeb, o autor, não é simplista na sua formulação de uma explicação para o desenvolvimento. Ele atenta para diversos fatores que determinam o desenvolvimento :  a educação, a religião , as condições geográficas e o conúbio entre a diversidade cultural e a coerção social. É categórico em acentuar serem de grande peso no processo o fator cultural. Principalmente o fator institucional . Bons fundamentos institucionais são bases para o desenvolvimento e a distribuição de renda.


A desigualdade é motivo de especulação do texto. As sociedades que tem na cultura uma visão de futuro conseguem investir no longo prazo e distanciar-se do subdesenvolvimento. Assim como as mais abertas são as mais favorecidas pelas inovações, que liberam as proles para o estudo e consequentemente outro patamar de renda. Entretanto, como as revoluções tecnológicas podem surgir  com possível rapidez o mesmo não acontece com a cultura, que muda lentamente e pode inviabilizar o desenvolvimento.


As populações mais numerosas propiciam maiores oportunidades para o surgimento de novas ideias. Elas não só tem mais cabeças pensando como oferecem tamanho de mercado ( massa crítica ) para remunerar as inovações. Vale a pena sublinhar a indicação do autor da importância de enfrentar o conflito entre a  diversidade cultural e a coesão social — desafio não resolvido no Brasil.


Esta é uma leitura oportuna para quem não quer ficar na superficialidade ao analisar as causas do nosso subdesenvolvimento e má distribuição de renda. Boa leitura.



São Paulo, 14 de junho de 2024.

Jorge Wilson Simeira Jacob

domingo, 16 de junho de 2024

 Small is Beautiful.


A humanidade sempre sofre  com alguns fantasmas, são  demônios  que nos atormentam, os atuais são : uma guerra nuclear, a degradação ecológica, a corrupção moral e o  decréscimo  populacional


Todas as épocas da história tiveram os seus fantasmas. Alguns tiveram os seus exorcistas, outros não .Os homens têm  sido vítimas dos profetas de desgraças . Um que alcançou grande notoriedade foi Malthus. Ele previa   insuficiência de  alimentos pelo crescente  desequilíbrio entre uma   população crescendo em escala geométrica  e uma produção em escala aritmética . O mundo estaria, segundo ele, caminhando para a fome generalizada.



Outro foi Nostradomus, que teria previsto vários eventos importantes no mundo. Entre eles estão a Revolução Francesa, a 1ª Guerra Mundial, a criação da bomba atômica e as mortes da princesa Diana e do presidente dos EUA John Kennedy. 


O malthusianismo foi exorcizado  pelo aumento da produtividade no setor agropecuária . A fome existente hoje no mundo, ao contrario do que acontecia na idade  media, não se deve a escassez de alimentos , mas do baixo poder aquisitivo de uma importante parcela da população.


Já os dirigentes do partido comunista chinês , há  décadas  ,  assustados com o fantasma de uma superpopulação impuseram  um desumano controle sobre a natalidade. Temiam os comunistas uma ruptura do sistema político e econômico pelo excesso de chineses. 


 Hoje, o mesmo partido , que se arrogava ao direito de violentar a liberdade individual, oferece estímulos financeiros para aumentar os nascimentos. Fracassou o pretendido controle demográfico.


O fantasma da super população foi exorcizado com a decisão espontânea das mulheres de , por razões ponderáveis , não desejarem  ter filhos. O fantasma mudou de roupa, agora ameaça com o  ônus   de uma população de anciões.


Com o desenvolvimento da  bomba atómica , o fantasma era proliferação das armas nucleares, que poderiam  cair no   domínio de governos inconsequentes. Hoje o Irã , um estado teocrático , dirigido por fanáticos , está próximo de ter a sua bomba; a Correia do Norte vive de chantagear o mundo com uma ameaça  nuclear; a China já  é de todas a maior das ameaças, sem esquecer da Rússia .  Esta guerra é um fantasma  que ainda não foi exorcizado. Uma conflagração com armas nucleares, em escala mundial , poderia ser o Apocalipse.


Outro fantasma que assusta milhões é o desequilíbrio ecológico . Alguns fenômenos naturais como o derretimento da calota polar, a elevação da temperatura, as chuvas torrenciais são   dados usados para mostrar o risco que corre a humanidade, se não cuidar da natureza. 



Houve épocas da historia que também tiveram alterações ecológicas , à qual a natureza e a humanidade adaptaram-se. Estaríamos vivendo outra destas fases? Se sim, seria mais um medo alimentado pelos profetas de fantasmas.


Não só  com fatos concretos que os demônios nos assustam. O fantasma da crise moral em que estamos mergulhando é sem dúvida um grande desafio. Ela é consequência da perda de identidade dos indivíduos. O ser humano virou um número , perdeu a personalidade,  e sendo ninguém tudo lhe é permitido. 


A concentração o populacional em grandes aglomerados, dezenas de milhares de habitantes em uma cidade e arredores, diluiu o efeito de contenção ao crime e  à imoralidade . Nos pequenos povoados há uma coerção social. Todos se conhecem e esperam ser considerados. Além de ser mais fácil identificar um infrator e puni-lo. A modernidade, com a versão materialista , em que a ciência substituiu as religiões fez com que tudo seja permitido e nada seja pecado.


Em busca de exorcizar os fantasmas que ainda nos atormentam levantaria a hipótese de se apostar na volta às origens. Um mundo menor. O que passaria com aceitar que seria o decréscimo populacional ( um dos atuais fantasmas ) ,   que exorcizaria todos os demais. Como dizem os gringos — smal is beautiful.



São Paulo, 05 de maio de 2024.

Jorge Wilson Simeira Jacob







Small is Beautiful.


A humanidade sempre sofre  com alguns fantasmas, são  demônios  que nos atormentam, os atuais são : uma guerra nuclear, a degradação ecológica, a corrupção moral e o  decréscimo  populacional


Todas as épocas da história tiveram os seus fantasmas. Alguns tiveram os seus exorcistas, outros não .Os homens têm  sido vítimas dos profetas de desgraças . Um que alcançou grande notoriedade foi Malthus. Ele previa   insuficiência de  alimentos pelo crescente  desequilíbrio entre uma   população crescendo em escala geométrica  e uma produção em escala aritmética . O mundo estaria, segundo ele, caminhando para a fome generalizada.



Outro foi Nostradomus, que teria previsto vários eventos importantes no mundo. Entre eles estão a Revolução Francesa, a 1ª Guerra Mundial, a criação da bomba atômica e as mortes da princesa Diana e do presidente dos EUA John Kennedy. 


O malthusianismo foi exorcizado  pelo aumento da produtividade no setor agropecuária . A fome existente hoje no mundo, ao contrario do que acontecia na idade  media, não se deve a escassez de alimentos , mas do baixo poder aquisitivo de uma importante parcela da população.


Já os dirigentes do partido comunista chinês , há  décadas  ,  assustados com o fantasma de uma superpopulação impuseram  um desumano controle sobre a natalidade. Temiam os comunistas uma ruptura do sistema político e econômico pelo excesso de chineses. 


 Hoje, o mesmo partido , que se arrogava ao direito de violentar a liberdade individual, oferece estímulos financeiros para aumentar os nascimentos. Fracassou o pretendido controle demográfico.


O fantasma da super população foi exorcizado com a decisão espontânea das mulheres de , por razões ponderáveis , não desejarem  ter filhos. O fantasma mudou de roupa, agora ameaça com o  ônus   de uma população de anciões.


Com o desenvolvimento da  bomba atómica , o fantasma era proliferação das armas nucleares, que poderiam  cair no   domínio de governos inconsequentes. Hoje o Irã , um estado teocrático , dirigido por fanáticos , está próximo de ter a sua bomba; a Correia do Norte vive de chantagear o mundo com uma ameaça  nuclear; a China já  é de todas a maior das ameaças, sem esquecer da Rússia .  Esta guerra é um fantasma  que ainda não foi exorcizado. Uma conflagração com armas nucleares, em escala mundial , poderia ser o Apocalipse.


Outro fantasma que assusta milhões é o desequilíbrio ecológico . Alguns fenômenos naturais como o derretimento da calota polar, a elevação da temperatura, as chuvas torrenciais são   dados usados para mostrar o risco que corre a humanidade, se não cuidar da natureza. 



Houve épocas da historia que também tiveram alterações ecológicas , à qual a natureza e a humanidade adaptaram-se. Estaríamos vivendo outra destas fases? Se sim, seria mais um medo alimentado pelos profetas de fantasmas.


Não só  com fatos concretos que os demônios nos assustam. O fantasma da crise moral em que estamos mergulhando é sem dúvida um grande desafio. Ela é consequência da perda de identidade dos indivíduos. O ser humano virou um número , perdeu a personalidade,  e sendo ninguém tudo lhe é permitido. 


A concentração o populacional em grandes aglomerados, dezenas de milhares de habitantes em uma cidade e arredores, diluiu o efeito de contenção ao crime e  à imoralidade . Nos pequenos povoados há uma coerção social. Todos se conhecem e esperam ser considerados. Além de ser mais fácil identificar um infrator e puni-lo. A modernidade, com a versão materialista , em que a ciência substituiu as religiões fez com que tudo seja permitido e nada seja pecado.


Em busca de exorcizar os fantasmas que ainda nos atormentam levantaria a hipótese de se apostar na volta às origens. Um mundo menor. O que passaria com aceitar que seria o decréscimo populacional ( um dos atuais fantasmas ) ,   que exorcizaria todos os demais. Como dizem os gringos — smal is beautiful.



São Paulo, 05 de maio de 2024.

Jorge Wilson Simeira Jacob










domingo, 9 de junho de 2024

 Alerta vermelho


Quem leu o Código da Vinci e gostou, vai também encantar-se com o livro o Alerta Vermelho. Enquanto o primeiro é uma ficção policial, o segundo é uma realidade com todas as tramas de um texto de ficção. É uma história real contada com tal maestria como são as obras de todo escritor muito talentoso .


O livro o Alerta Vermelho ( Amazon, Bill Browder,  $52,43,  398 pg ) conta a trajetória do fundador do Fundo Hermitage, que foi o maior investidor nas privatizações da Rússia. 


 Neste enredo, Browder abre as entranhas do corrupto governo Putin. É daqueles textos grudentos. Colam o leitor não o deixando interromper a leitura de tão interessante que é.


Não falta no enredo nada. O corrupto jogo político que existe na Rússia, a falta de segurança jurídica existente, a fragilidade do cidadão ( melhor dizendo, servos )  perante os órgãos públicos , a manipulação desonesta dos oligarcas ligados  ao governo… até a vida amorosa do Bill e as suas duas esposas. Casou-se duas vezes.


O autor , no subtítulo, qualifica-se  como o inimigo  número um de Putin. E este livro é um instrumento de sua luta. Ignorar este texto é desconhecer a história dos primeiros anos do capitalismo russo e a negativa cultura que ficou após o  final do comunismo com a queda do Muro de Berlin. 


A Rússia saiu do comunismo, mas não dos males de uma sociedade viciada na vida burocratizada  e corrupta levadas ao extremo . O comunismo educou o homem russo para o jogo político , o aproveitar-se sem escrúpulos das oportunidades e o absoluto desrespeito ao mérito. A corrupção fincou-se  na cultura do povo. O assassinato dos inimigos , comum no  comunismo, tornou-se uma pratica corrente.


Como herança cruel, o  comunismo sedimentou  a impotência do indivíduo frente ao autoritarismo do governo. Um capítulo que aborda a sina de um modesto advogado, Sergei Magnitsky , acusado injustamente e que foi torturado até a morte sem ter tido direito à defesa é um dos exemplos.  Na Rússia as leis não protegem os cidadãos, mas são usadas para atender aos desígnios dos poderosos.


Bill Browder, o autor e principal personagem do romance,  foi um empresário americano bem sucedido, mas a custa de muitos sacrifícios. Os seus fabulosos resultados foram fruto da sua competência, mas sobretudo de uma determinação de vencer custasse o que custasse. Suportou revezes em uma trajetória de alto risco e tensão que poucos suportariam.


O Alerta Vermelho é uma história real romanceada de forma elegante e coerente. Tudo se encaixa bem no propósito do autor de pôr às claras os horrores da ditadura russa para servir como escudo de defesa à sua segurança pessoal. Segundo ele é preciso denunciar para , se alguma coisa acontecer comigo, todos saberão identificar o responsável— Putin.


Os exemplos das execuções de aqueles que contrariam o sistema são escancaradas. O escândalo do roubo ao tesouro de 230 milhões de dólares , denunciado por Browder foi motivo da perseguição que sofreu. O que o forçou a fugir de Moscou para Londres.


Lutador incansável,  o autor conseguiu do Congresso americano uma lei para impedir o ingresso nos Estados Unidos dos torturadores e corruptos russos como resposta à morte de Sergei — a quem dedicou o livro com a seguinte mensagem : “ Para Sergei Magnitsky, o homem mais corajoso que já conheci”. 



Não será surpresa se este seja o enredo de uma série de filmes de um dos streamings . O livro tem todos os ingredientes para justificar um bom espetáculo. 



Diz Bill Brawder em um trecho do livro: — “ Qualquer um que já leu Tchekhov, Gogol ou Dostoiévski, sabe bem … que histórias russas não têm final feliz. Os russos conhecem bem a dificuldade , o sofrimento e o desespero, mas não o sucesso e certamente não a justiça “.


São Paulo, 26 de maio de 2024

Jorge Wilson Simeira Jacob


domingo, 2 de junho de 2024

 Ritos de passagem


Passamos pela vida como se tivéssemos os olhos semi-fechados. Não vemos com clareza a maior parte do que acontece sob as nossas vistas.  Vivenciamos no dia a dia situações  ignorando o seu significado. Entre tantos, os  dois maiores eventos da nossa existência —  o nascimento e a morte não são devidamente avaliados. Uma miríade de outros  preenchem a nossa vida sem termos consciência dos seus significados e repercussões. O sexo, mãe da vida e de prazeres, está entre as muitas causas que são encaradas pelo povo de forma diversa dependendo da época e cultura.


A antropologia, ciência recente, pretende explicar as causas das cousas nossas. Não só explicar, mas principalmente abrir de todo os nossos olhos. Isto é o que conseguiu fazer Arnold Van Gennep no seu clássico livro Os Ritos De Passagem ( editora Vozes, 4* edição, $ 54,23, 164 pg ). No texto, o autor aborda os ritos e introduz pela primeira vez no campo da Antropologia Social o ritual e os mecanismos básicos como um objeto de estudo relevante.


A vida é rica em momentos de transformação o que Van Gennep didaticamente  batizou de passagens. Todos os eventos sociais marcam passagens. Em umas a comemoração pela mudança é festiva — o casamento por exemplo; em outros é de acomodação — o luto. Todas cumprem a função de nós ajudar a compreender e nos ajustar a  uma nova realidade.


Surpreende no livro, muito baseado em estudos de  sociedades primitivas, como  as passagens são variadas e diversas. O sexo, como não poderia deixar de ser, é encarado de tantas maneiras que surpreendem. A virgindade, a promiscuidade, a abstenção sexual ou o seu uso não é uma constante. Varia de cultura a cultura.


Não só as sociedade primitivas têm os seus ritos — e elas os têm em quantidade, mas também as desenvolvidas têm o seus. Quer sejam da vida pessoal, do social, do político e muito em especial do religioso.


Portanto, todas as atividades humanas têm ritos de passagem. Elas estão impregnadas na política, nas religiões, na vida em geral. Comemora-se feitos nacionais, como também datas religiosas. De todas as passagens a que melhor serviço presta ao psicológico das pessoas é o luto. As roupas pretas, as cerimonias religiosas, a reclusão…são instrumentos que ajudam a adaptação à nova realidade.


Conhecer o texto de Van Gennep é fundamental, pois com frequência somos confrontados com exemplos de “ passagens” e é necessário saber do que se trata. Não faltam comemorações a marcar eventos em nossas vidas que não façam parte de um rito de passagem , como ideia desenvolvida pelo autor.



Van Gennep é considerado entre os grandes autores que marcaram os estudos antropológicos. Nasceu na Alemanha, filho de mãe francesa, em 1873. Estudou em Lyon filosofia e matemática. Morreu na França em 1957. O seu livro mais importante, o que o fez notável, foi Les Rites de Passage — motivo desta resenha.



São Paulo, 22 de maio de 2024

Jorge Wilson Simeira Jacob