Dar de si.
Ela foi condecorada na Bélgica como heroína na guerra contra o nazismo. Lutou em todas as frentes, desde a espionagem até em combates armados, sempre destacando-se entre os seus pares. Presa pelos nazistas, saltou do segundo andar da prisão para alcançar a liberdade. Na queda quebrou uma perna, o que não impediu a sua fuga.
A Sra. Glaz, tinha a motivação dos judeus, era judia, na luta contra o nazismo. Ela era uma figura marcante. Nas reuniões dominava a conversação com os detalhes da sua vida heróica. Tornou-se uma personalidade. Onde quer que estivesse terminava como o centro das atenções e da admiração.
Evidentemente, a sua história, de tão repetida, foi perdendo interessados. Ela sentiu a perda da posição de destaque. Já que não tinha outra história, senão aquela, para ter ouvintes deveria mudar de ambiente. Foi o que fez. Descobriu nos cruzeiros marítimos um novo público. Cada nova troca de passageiros a colocava novamente em evidência. Era o que na sua idade avançada dava-lhe motivação para viver. Mantinha viva a sua história de heroína trocando os ouvintes. Assim passou a viver de cruzeiro em cruzeiro ganhando a admiração com o seu desempenho na guerra.
A nossa heroína não diverge da totalidade das pessoas . Todos, jovens e idosos, têm narrativas que desejam partilhar. Os jovens tem no celular o seu instrumento de contatos. Eles se satisfazem com o uso da internet e pelo fato de estarem construindo histórias de novas descobertas e conquistas. Nunca estão isolados do mundo. Já os idosos, só tem uma história e a repetem a cada oportunidade. É o que eles têm! Acontece que os seus circundantes, com frequência, demonstram desinteresse pelo caso repetido, o que afeta o seu ânimo.
O ser humano certamente desenvolveu a capacidade de comunicar-se para suprir uma carência. Somos seres gregários. A nossa sobrevivência depende das trocas que fazemos com nossos semelhantes. A solidão é mortal. Recordar é viver! Dar e receber é uma troca virtuosa. E é contando e recontando as nossas experiências que damos significado ao nosso viver.
Não basta estar na multidão se não houver o que ouvir ou que falar. O isolamento é um sentimento que vem da ausência de comunicação. Sentimento que atinge fortemente aqueles poucos que atingem uma idade avançada. Como nem todos têm condições de viver de cruzeiro em cruzeiro para desbravar novos ouvintes, só resta a repetição. Porém esperar pela boa vontade e paciência dos outros é uma aposta perdida.
Ninguém demonstra prazer em ouvir o mesmo pela segunda vez. E as reações são as mesmas, dizem: “ contam as mesmas histórias a cada novo contato”. A razão é que isto é o que elas tem e é o que preenche as suas necessidades de colocar em comum o que é seu. Poucos realizam esse ímpeto de comunicação, esse “dar de sí” embute uma dose de generosidade.
Essas considerações ocorrem-me, ao avaliar a minha participação no meu blogue e no Jornal Opção. Tenho nessas colunas semanais —desde que não posso viver de cruzeiro em cruzeiro — uma oportunidade de me comunicar com os leitores dando o melhor de mim para conquistar as suas atenções. É um desafio semanal tentar escrever algo que cative o leitor … e torcer pra ser lido e, se possível, compreendido.
Sou agradecido aos meus leitores, que me ajudam a evitar o isolamento em que caem os de idade avançada.
São Paulo, 25 de outubro de 2023.
Jorge Wilson Simeira Jacob
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