segunda-feira, 30 de janeiro de 2023

 A REFORMA POLÍTICA.



Dentre tantos vícios humanos, um que merece destaque, por seus efeitos deletérios , é a vaidade. Ela é a embocadura da arrogância. O vaidoso acreditando ser aquele que gostaria de ser, assume  posturas audaciosas,  arrogantes. Por ter ganho uma eleição, perde a noção de como a glória é efêmera. Perde a medida dos seus limites. E esta é , no geral , a causa da sua perdição. 


Nenhuma ação humana alimenta mais a vaidade do que o exercício da atividade política. Nos regimes autocráticos, monarquias, ditaduras e pseudo-democracias, é onde encontram-se os ninhos ideais para a satisfação da vaidade. Um poder dividido não atende a ganância de um autoritário. Ele sempre acredita poder ter mais.


Nas democracias plenas, seguindo o modelo genialmente arquitetado por Montesquieu, que dividiu o Estado entre três poderes, executivo, legislativo e judiciário, nenhum homem tem o direito de ter poder absoluto contra qualquer  cidadão. Mesmo o mais humilde deles. Ninguém pode exercer um cargo público sem limitações.


Se na teoria da democracia plena a divisão de poderes tem o sabido “check and balance”, que significa que o que um faz deve ser conferido e avaliado pelos outros poderes. E a Constituição é o parâmetro de todas as decisões. Ela representa a vontade do povo. Pelo menos esta é a ideia. Na prática, porém, nem sempre é assim que funciona.


Não por menos,  por ser o berço de Montesquieu, a França separa o Estado do Governo —  sistema semi-presidencialista. O presidente representa o estado e um primeiro ministro, o governo. A câmara dos deputados são eleitos diretamente pelo eleitorado e os senadores, em segundo turno, escolhidos por todos os eleitos na última eleição— um número de 165.000 eleitores. Dando assim um perfil mais  conservador ao senado. O judiciário também segue um processo seletivo de escolha.


No Brasil, temos um presidencialismo , mas não pleno, mas ainda assim dando muito poder ao  executivo. Eleito por voto popular direto, que estimula o governo baseado na popularidade carismática do presidente. Enfraquecendo o “check  and balance” existente no sistema americano e francês.


Depois de alguns anos de nossa prática de uma democracia parcial, algumas situações fazem pensar.  Chama atenção a instabilidade política em que vivemos. O impeachment virou moeda corrente. A conclusão, como vamos apontar, são as nossas instituições que exacerbam a vaidade dos políticos , principalmente na presidência, levando-os à arrogância de serem merecedores de mais poder. Evidentemente o populismo é o instrumento dessa arrogância .



Também merece atenção  as tentativas dos presidentes  apoiarem -se na opinião pública para subjugar os outros poderes. Ou o judiciário “ legislar e punir  em vez de só julgar”.  Ou o legislativo criar um grupo alinhado — Centrão —  para “ negociar” as leis…ou um impeachment.


O equilíbrio de forças é deveras muito difícil. No presidencialismo  o presidente tem muito poder e alta exposição. Uma tentação para os bajuladores o influenciarem a um viés totalitário. Na prática,  no poder esquecem , por acreditar no carisma pessoal, poder chegar ao poder absoluto aliciando as massas. E tome populismo nas campanhas eleiçoreiras e mesmo durante o governo.


Atendo à história recente do Brasil, vemos que várias  tentativas foram feitas e todas tiveram o mesmo desfecho — o fracasso. É essa coerência que indica a necessidade de uma verdadeira reforma política como fez De Gaulle na França. 


Lembremos:

  - Jânio Quadros surfava nos píncaros da popularidade. As suas ações moralistas, até ridículas, como a proibição do Bikini, as brigas de galo e posturas de policial do trânsito, tinham grande popularidade. Fazia pouco caso do “establishment”. As forças ocultas , alegou, o impediam de governar. Renunciou  para, a exemplo de De Gaulle, voltar com plenos poderes. A arrogância custou-lhe o cargo.


 - João Goulard, um êmulo em incompetência à Dilma Rousseff, apostou no apoio dos Sindicatos, ignorou o “establishment “ e foi deposto. Teve os  parceiros errados. O erro custou-lhe o cargo.


 - Fernando Collor dava mostras de onipotência. Nem com o irmão dividiu o butim da corrupção. Apelou para a opinião pública. Ficou isolado. O final foi o impeachment 


Em nossos dias chega a vez do Jair Bolsonaro. Eleito principalmente com a promessa de moralização dos costumes; na  liberalização da economia para dinamizar o desenvolvimento e reduzir a corrupção. Prometia o fim do” toma cá, dá lá” , baseando o apoio político em diversas bancadas, a evangélica, a da bala, a agrícola… O que o libertaria do Centrão. Só no meio termo do seu mandato, quando não conseguia ter aprovados os seus projetos no legislativo, rendeu-se ao Centrão.


 Mas, individualista, fechou-se na família, não conseguiu agregar apoio no establishment: 

 - Os militares não se engajaram na defesa do seu governo;

 - Os conservadores e os liberais consideravam-se traídos pelas promessas não cumpridas.

 -  A imprensa, os artistas, a quem    criticava pelas verbas generosas das estatais e da mamata da Lei Rouanet fincaram estacas de oposição contribuindo para o seu estilo pouco afeito à conciliação. De discurso grosseiro, morreu como peixe — mais pela boca e  menos pelo fez.


A arrogância de Bolsonaro custou-lhe a reeleição e aos eleitores liberais-conservadores o vazio de uma liderança. Este é um mal  legado do seu  governo: deixar a oposição sem um líder.


O presidente Lulla, experiente na arte das eleições, montou uma equipe de governo com um único critério —  cooptar o apoio do establishment político , pois sem ele o Brasil está ingovernável. Mas deste  nível de equipe nada de bom pode se esperar.


Será um estadista Lulla, se usando a sua habilidade como manipular das pessoas, e  o momentâneo crédito de inicio de governo,   colocar como  prioridade a Reforma Política para limitar  a arrogância dos poderosos e tornar o Brasil governável.Se isto não acontecer, na dá para ser otimista com o futuro do Brasil.


Sao Paulo, 26 de janeiro de 2023.

Jorge Wilson Simeira Jacob


sexta-feira, 20 de janeiro de 2023

 A MINHA FORMAÇÃO.


O tempo é a mãe da verdade. Nada como o tempo para depurar os fatos. Um livro pode ganhar notoriedade momentânea mesmo tendo pouco valor, mas só os clássicos superam o tempo. Por isto, ainda que não ignore a importância de  textos novos, escolho também para minhas leituras alguns  dos clássicos. A Minha Formação de Joaquim Nabuco, que está sempre na lista dos recomendados nas escolas, é um  desses. Vale a pena ser lido. Venceu o tempo por seus méritos.




Joaquim Nabuco foi um político nos anos finais da monarquia, que notabilizou-se na luta pelo fim da escravidão no país. De família de políticos destacados, Nabuco era um grande orador e homem de letras. Autor do A Minha Formação, Um Estadista no Império e Das Pensees Detachées entre outros. Por trinta anos empenhou-se ao lado de outros liberais pelo abolicionismo. De visão perspicaz, tendo vivido certo tempo no exterior, faz uma análise comparativa das características do povo inglês, francês, americano e nós.


Chama a atenção no texto descobrir como a cultura de um povo pouco altera-se na sua essência ao passar de quase dois séculos. Os povos, inclusive nós, já éramos culturalmente o que somos depois de tantos anos. Entre os submetidos à sua análise, ainda que reconheça valores nos franceses, nos americanos, destaca os ingleses. Ele amava Londres!


Disse Nabuco: - “ só há… um um grande país livre no mundo. A Suíça é um país livre, mas é pequeno; os Estados Unidos é livre, mas há nele, sem falar na sua justiça,  a lei de Lynch, que lhe está no sangue… A França é um grande país e livre, mas sem espírito de liberdade arraigado, sempre sujeito às crises das revoluções e da glória. Surpreende na Inglaterra o governo da Câmara dos Comuns, a sua suscetibilidade às oscilações do sentimento público. Sobretudo a autoridade dos juízes. Só há um país do mundo onde os juízes são mais fortes do que os poderosos: é a Inglaterra”.


A par da liberdade, Nabuco dá atenção à tradição, como base do temperamento nacional. “ O inglês compreende e penetra a grandeza do sistema que se perpetua mais do que as revoluções, ao contrário do latino, que pode viver e ser  feliz em solo político oscilante, sujeito a terremotos contínuos… O progresso é  governado por algumas regras elementares: conservar do existente tudo o que não seja obstáculo invencível ao melhoramento indispensável; outra que o melhoramento justifique o sacrifício da tradição; outra regra é respeitar o inútil que tenha o cunho de uma época; outra deixar ao tempo a incumbência de experimentar o novo…dessas regras resulta o dever de demolir com o mesmo amor e cuidado o que outras épocas edificaram”.


Nabuco herdou o seu liberalismo do pai, Senador Nabuco.As ideias da liberdade individual desde cedo colocaram o seu talento de escritor, orador e político na luta pela libertação dos escravos. Nabuco não media esforços e assumia os riscos  em defesa do abolicionismo . Foi ter com o Papa Leão Xlll para pedir uma encíclica que orientasse os padres em defesa dos escravos, pois o clero mostrava-se indiferente à sorte dos escravos. Mostrou ao Papa que os libertos seriam acréscimos  ao seu rebanho. Encíclica que, prometida, só foi publicada depois do 13 de Maio, depois da Lei Áurea. 


Dois episódios das vidas dos escravos marcaram Nabuco. Quando menino, sentado na varanda da casa da fazenda onde foi criado, um jovem escravo, nos seus dezoito anos, lança-se aos seus pés implorando para que fosse comprado, pois no engenho vizinho era muito maltratado…e não aguentava mais. Outro foi o caso de um escravo que suicidou-se quando soube ter Nabuco não ter sido reeleito.


O 13 de maio, um movimento dos liberais,  foi um golpe fatal na Monarquia, em 15 de novembro. Mesmo assim , segundo Nabuco, a princesa imperial dirige-se ao abolicionista Rebouças no vapor Alagoas, que os levava para o exílio, dizendo: “ se houvesse ainda escravos no Brasil, nós voltaríamos para libertá-los”. Desnecessário alertar ao fato de ser Nabuco um admirador de Dom Pedro ll, a quem descreve como um estadista e homem virtuoso.


Nabuco viveu intensamente como  intelectual e político. Conviveu com inúmeros nomes históricos do Brasil e do mundo. Foi um expoente no seu tempo. Amante da liberdade, que não queria só para si, mas para todos. Morreu como embaixador brasileiro em Washington, em 1910, aos sessenta anos de idade. Seu corpo foi transportado para o Brasil a bordo do cruzador americano, o North Carolina, destacado para essa missão, e comboiado pelo encouraçado brasileiro Minas Gerais para receber na pátria os funerais que a pátria reserva aos seus filhos ilustres.


O livro A Minha Formação de Joaquim Nabuco é um clássico —  por isto sobreviveu aos tempos.


São Paulo, 11 de janeiro de 2023.

Jorge Wilson Simeira Jacob


segunda-feira, 16 de janeiro de 2023

 A IMPOTÊNCIA SEXUAL.


Os homens enfrentam um desafio que as mulheres ignoram. Nas relações sexuais, elas não enfrentam o risco masculino da não ereção do membro sexual. Na contrapartida, uma vagina seca pode ser lubrificada artificialmente, se uma boa sessão de carícias não resolver. Já o homem, em caso de um fracasso momentâneo, não existe alternativa. Brochou! Fim de festa. Só resta o vexame.


Como não existe aviso prévio, até que a ereção aconteça, o homem enfrenta a insegurança de um fracasso. E, como estes acontecem a todos, permanecem na memória. Por receio de um fracasso, os homens tendem a antecipar a penetração. Em não estando a parceira devidamente preparada, pode levar a uma  ejaculação precoce, que não dá à fêmea o tempo de excitação necessária para atingir o orgasmo.


Não só o temor pode levar à brochura. Há aspecto outros como : problemas físicos, estresse, fatores ambientais ( cheiro, ruído, insegurança … ) . A estes se soma o nível de ansiedade , que varia de indivíduo para indivíduo. E quanto maior a ansiedade ou emoção, maior o risco de não ocorrer a ereção. Este é um fato  independente do nível de masculinidade do macho. Da mesma maneira que um ser experiente, conhecedor da fisiologia feminina, deve saber que a mulher necessita de “carinhos preparatórios” para conseguir a lubrificação. 


Os casos de “fracassos femininos” , que acontecem quando o libido não está excitado, não impedem que a mulher, mesmo não se satisfazendo deixe de atender  sexualmente o seu parceiro. O que não acontece com o homem. Acrescente o fato constrangedor do indivíduo ficar impedido de cumprir a função de macho. 


As relações estáveis minimizam este problema. A menor ansiedade, por não ser novidade , propicia maior segurança diminuindo os números de fracassos. Não há pressa. O tempo está a favor. Pode-se ter a relação seguindo a rotina do casamento, que é dormir na mesma cama. Quando o ato transcorre naturalmente.


Já nos casos eventuais, o encontro não é rotineiro. E o fator novidade provoca excitação anormal. Quanto maior for a cobiça por uma conquista, maior a ansiedade e, consequente, o risco do fracasso. A novidade, quando excessivamente desejada, pode ser uma faca de dois gumes. De um lado estimula e de outro aumenta a insegurança. O que pode resultar na impotência . Emblemático é o caso do Belo Antônio, filme baseado no livro de Vitaliano Brancati, com Marcelo Mastroianni e Claudia Cardinale, em que o ato sexual não se consuma no casamento.



São Paulo, 30 de dezembro de 2022.

Jorge Wilson Simeira Jacob


sexta-feira, 13 de janeiro de 2023

 




O Modelo Singapurense.


O  Muro de Berlim  não foi só uma divisa geográfica  que desunia as duas Alemanhas. Foi fundamentalmente um marco na história das ideologias.  A sua queda, se não foi o fim da história,  como preconizou Fukuyama, que assegurava, que doravante só restaria no mundo como  opção a  democracia liberal, foi o fim da ideologia comunista. Com o desmantelamento da União Soviética ( URSS ), restou no mundo comunista a China e uns poucos inexpressivos países   como Cuba, Albânia e  Coreia do Norte.  


Na China, entretanto, o regime estava nos seus estertores. Nos finais dos trinta anos do governo de Mao Tse Tung ( 1976), um poeta tirano, o país vivia um caos econômico e político. Com a sua morte, assume, em 1978,  Deng Xiaoping, como Secretário Geral do PCC, líder da área direitista do partido, que viria a ser o responsável pela fundação da China moderna. Ele viveu em Paris com uma  bolsa de  estudos, onde foi simultaneamente,  operário, bombeiro e ajudante de cozinheiro. Fez curso de graduação de comunismo em Moscou. Tinha por vivência e mentalidade  uma  visão prática da vida. Não era um poeta como Mao, mas um realista.  


Como Primeiro Ministro Chinês , Deng fez visitas aos EUA, Japão e Singapura para observar as economias que estavam dando certo. Destas, o impressionou o Modelo Singapurense. Um governo  baseado na meritocracia, boa governança e ausência de corrupção.  Singapura era um casamento de  democracia autoritária e total  liberdade econômica, que colocou uma  ilha pobre de recursos em um dos países mais prósperos do mundo.  Singapura, com tributação baixa, ambiente favorável ao empreendedorismo e o primeiro lugar no Ranking de Liberdade Econômica, saiu da condição de um entreposto colonial pobre e violento para ser um dos 4 Tigres Asiáticos. Atingindo a condição de estar entre as quatro mais ricas regiões do mundo medidas por renda per capita.


Quando Singapura separou-se da  Malásia, tornando-se um país independente , teve como Primeiro Ministro Lee Kuan Yew,  de 1959 a 1990. Com  um governo forte,  leis severas, mas com ambiente favorável aos negócios, o país desenvolveu-se tornando um modelo a ser imitado. Lee foi estudante  da London School of Economics, onde lecionaram, Friedrich Hayek, Karl Popper e outros expoentes do pensamento liberal. Os resultados do acerto do seu governo, copiado pela China, são eloquentes se analisados por qualquer parâmetro, mas especialmente com o Brasil. Vejam os dados, a seguir:


Competitividade: Cingapura 1º x  Brasil 71º

Liberdade econômica: Cingapura 1º x Brasil 144


Facilidade para empreender: Cingapura 2º x Brasil124º

Horas gastas por ano para pagar imposto: Cingapura 64h xBrasil  1.501horas

Liberdade Individual: Cingapura 30º x  Brasil 109º


IDH: Cingapura 9º x  Brasil 79º

PIB Per Capita: Cingapura 3º x  Brasil 90º

Carga tributária: Cingapura 14,1% x Brasil 32,3%


PISA (média): Cingapura 2º x Brasil 68º


Deng , uma mente aberta e disposto a ouvir, tomou Lee como referência . São muitas as ocasiões  em que se aconselhou com ele. Aproveitando do bom relacionamento,  enviou 22 mil funcionários chineses para estudar Singapura. Seguro do caminho a seguir, inicia uma reforma da economia de baixo para cima. Começa pelos municípios com uma total abertura nas famosas Zonas Francas de Livre Comércio . Uma revolução dentro de uma economia estatizada. A abertura da  economia de comando para a de mercado, não aconteceu  sem as resistências dos ideólogos do partido. Deng, porém , foi pragmático: “ não importa a cor do gato, desde que cace o rato” . Frase que ficou como a  marca  do estadista. 



Nascia, assim, com o  comando do denominado “ chefe das reformas “   uma  nova China, que  tornou-se a primeira economia mundial, tirando da miséria milhões de chineses. Deng é , pois,  o fundador da  China Moderna. Os seus gatos, mais capitalistas do que os capitalistas do ocidente, caçam os ratos em todos mercados mundiais. Enquanto nós outros ficamos bordando a ideologia do “ tudo pelo social” , gerando distorções e desemprego,  os chineses pragmáticos caçam os nossos ratos. Sem resultados, ficamos pobres de ratos, mas ricos de ideais - que não pagam as contas. A diferença está em quem sabe copiar o que deu certo  e os  que insistem  em andar em más companhias. Referendando a crença popular dos chineses de que “neste mundo nada se cria, tudo se copia”… de preferência o que funciona.





São Paulo, 17 de março de 2022.

Jorge Wilson Simeira Jacob


sexta-feira, 6 de janeiro de 2023

  

A INVEJA.



As desigualdades sócio-econômicas distanciam  as pessoas, em uma sociedade,  como também afastam  regiões, uma das outras, em uma nação. Não há como manter-se um relacionamento natural com condições muito desiguais. Os mais favorecidas circulam em outro universo e tem em comum outros interesses do que os desfavorecidos.


Enquanto o rico discute a última moda ou a próxima viagem ao exterior; o pobre está preocupado com o emprego e a violência na favela. Enquanto um dá vazão aos sonhos, o outro rumina a dura realidade. A coexistência entre os desiguais existe somente no trabalho ou nas relações comerciais. Socialmente são mundos à parte. Vivemos e circulamos em guetos, ignorando a realidade do continente . Quem olha pela janela do carro e questiona as condições de vida do pedinte do semáforo? A indiferença é a tônica… mal e mal se dá um trocado.


Essa realidade coloca às sociedades um desafio político, que é a manutenção de uma convivência harmônica. O que não é um desafio de pequena monta. Não só as duras condições de vida dos menos favorecidos é um fator de discórdia, mas, acima de tudo, o exercício da comparação entre as situações dos que têm para os que nada têm. A inveja é outro elemento desagregador. A  igualdade, mesmo na miséria,  não provoca a inveja. A razão da revolta é a desigualdade, ela é o estopim da insatisfação.



Não por menos, por inveja , Caim matou Abel. A inveja é o pior veneno existente para o convívio entre os humanos. A comparação do ter mais ou menos é uma prática comum. Mesmo nas pequenas unidades, como a família, por exemplo, os choques de inveja não deixam de existir. E a inveja não se manifesta só por diferenças materiais. Elas acontecem também em confrontos de condições pessoais. Um ser desprovido de beleza física, inveja um belo; um deficiente, um atleta; um tímido, um  desinibido… A única condição que não provoca a inveja é o “bom senso”, como bem identificou Descartes: “ é a única condição de que ninguém sente-se carente. Todos se consideram bem aquinhoados “.


Há duas categorias de inveja: a entre as pessoas a as que ocorrem no âmbito  social. A inveja pessoal é   mais facilmente identificável   e entendida. Já as outras, as sociais,  ocorrem de forma pouco explícita e não são facilmente identificáveis. Estas manifestam- se de forma geral no preconceito contra os “ ricos ou riqueza” . 


A inveja tem muito a ver com a cultura de um povo. Abusando de um certo reducionismo , tomemos duas culturas como exemplo.  Enquanto nos países católicos condena-se a riqueza, nos países protestantes o criador de riqueza é endeusado. A consequência é nos países predominantemente católicos existir uma maior inveja do rico, do bem sucedido, enquanto nos de cultura protestante haver socialmente uma admiração  aos bem sucedidos.


Max Weber, economista e sociólogo, no seu clássico livro A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, analisando as causas do maior desenvolvimento dos países anglo-saxônios em comparação com os latinos, desenvolveu a tese de ser a religião o diferencial desses  resultados. 


O protestantismo vê no indivíduo próspero uma benção de Deus. Há uma forte relação entre o ascetismo intramundano e a crença na predestinação. O protestante era convicto de que seu agir, ou seja, o trabalhar diligente, era vontade de  Deus para sua vida. Ser predestinado permitia a justificação do acúmulo, do sucesso financeiro e eliminava o conflito entre sorte e merecimento.


O capitalista austero-empreendedor é bem visto pela sociedade protestante, Já o catolicismo estigmatiza a riqueza,   que é condenada socialmente — menos a do Vaticano, que reina no luxo e da usura .A inveja não é só um veneno as relações pessoais, mas também — desestimulando o empreendedorismo —  é um empecilho ao desenvolvimento sócio-econômico.



São Paulo, 04 de janeiro de 2023.

Jorge Wilson Simeira Jacob