Votando com os pés.
Há situações que não deixam margem para dúvidas: preto e branco, calor tórrido e frio extremo, nudez total e traje à rigor e assim vai. As que deixam dúvidas são as intermediárias. Referindo-se às cores temos uma diversidade de tons; à temperatura e aos trajes temos também inúmeras variações…
Na definição política temos as situações bem definidas, ainda que tenham nuances, como: comunismo e capitalismo. Como também temos nuances mais ou menos fortes destas correntes de pensamento. Como no caso do Brasil, que é meio socialista.
O comunismo refere-se à supressão total e absoluta da propriedade. Tudo pertence ao Estado e todos delegam a ele a liberdade individual e inexistência do livre arbítrio. O Estado ( burocracia) é quem decide da felicidade dos cidadãos. No capitalismo, a propriedade, a liberdade e a escolha da felicidade dependem do próprio arbítrio pessoal. Estes são considerados “direitos fundamentais “.
Na democracia liberal, que é o extremo oposto do comunismo, os governantes são escolhidos pelo votos em eleições livres e honestas, que não admitem nuanças — são ou não são. Nos regimes comunistas, o cidadão não escolhe os governantes. É submisso à vontade do partido único ( nomenklatura - a turma que mama nas tetas do governo ) ou, se puder, emigra, que é votar com os pés. Caso dos cubanos, venezuelanos, no presente, e das vítimas da URSS, antes da queda do muro de Berlin, que sinalizou a falência do sistema comunista e a morte do marxismo.
O contraste entre a qualidade da preferência das pessoas fica evidenciada na corrente migratória. Milhões fazem filas, enfrentam barreiras mil para viver nos Estados Unidos fugindo de Cuba, Venezuela e outros países socialistas. Em contrapartida ninguém faz fila para ir morar nos “paraísos socialistas”. Os de lá, como não podem exercer os seus direitos fundamentais , votam com os pés. Triste é analisar as estatísticas e encontrar o Brasil, que acreditava-se seria o país do futuro, que deveria estar atraindo imigrantes, estar aumentando o voto com os pés.
O número de brasileiros no exterior saltou de 1,9 milhão em 2012 para 4,2 milhões hoje. E o fenômeno tende a prosseguir: em 2018, 70 milhões afirmaram que deixariam o país se pudessem. De cada três brasileiros um perdeu a fé no país.
A quantidade de brasileiros que moram em países da Europa cresceu 29% entre 2020 e 2023 (dados mais recentes do Itamaraty), passando de 1,3 milhão para 1,6 milhão. Portugal, que tem sido o principal destino, viu sua comunidade brasileira praticamente dobrar… Crise econômica, instabilidade política e violência são os principais motivos para deixar o Brasil.
Um indivíduo só abandona o seu país, abre mão da sua cultura, em caso de absoluta desesperança, da perda da fé em dias melhores. O sofrimento do emigrante não dá para ser descrito com palavras: as perdas do convívio familiar, dos amigos, dos hábitos do dia a dia e, muito importante, a sua cultura comum.
Um imigrante nunca tem o mesmo tratamento que recebe um local: as barreiras do idioma, o desconhecimento da história, as diferenças dos cacoetes sociais, os usos e costumes, são barreiras que apenam o imigrante.
A emigração é um investimento na segunda geração. A primeira pagará com heroísmo a ousadia de votar com os pés. Vejo isto na experiência de um filho, formado em universidade americana, casado com uma cidadã americana, naturalizado como cidadão americano, que tem como idioma em casa e nos negócios o inglês, ainda que integrado na sociedade e exitoso nos negócios, testemunha que em muitas reuniões com os locais muitas vezes sente-se deslocado por não ter as histórias de infância dos atuais amigos e as diferenças culturais — sente-se um peixe fora d’água.
Conhecer a realidade de um emigrante é tomar consciência de não ser uma solução fácil abandonar a terra onde nascemos e vivemos boa parte da nossa vida. As alternativas são como a escolha entre o branco e o preto. Não há nuances. É a escolha de um sacrifício.
Ainda, por mais desesperançado que seja o nosso atual estado de desencanto com o Brasil, serve de alento olhar a Argentina, que destruída pelo peronismo, começa a refutar o socialismo populista e está implantando um regime em que prevalecem os direitos fundamentais da democracia liberal. Os argentinos expatriados, recuperada a esperança, devem votar com os pés, no sentido inverso, voltando para casa.
Oxalá chegará a vez dos nossos expatriados!
São Paulo, 15 de março de 2025.
Jorge Wilson Simeira Jacob
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