A política como teatro do absurdo
Qual o sentido da vida?
Nenhum.
O Teatro do Absurdo é uma expressão cunhada em 1961 pelo crítico húngaro radicado na Inglaterra, Martin Esslin (1918–2002), para reunir autores que, embora distintos em forma e estilo, partilhavam uma mesma inquietação: revelar, de maneira inesperada, a falta de sentido da experiência humana. Essas obras, frequentemente inspiradas no existencialismo, expõem um mundo em que a comunicação falha, o propósito evapora e o homem se confronta com o vazio.
Entre seus expoentes está Samuel Beckett, cuja famosa peça Esperando Godot apresenta um personagem que jamais aparece. Godot é o símbolo das expectativas humanas — aquelas figuras, promessas e esperanças que nunca se concretizam.
O impacto do Teatro do Absurdo reside na fidelidade com que espelha a nossa própria trajetória. A vida, afinal, não passa de uma encenação contínua. Quando crianças, brincamos de heróis ou vilões; inventamos mundos, medos e façanhas. Nada muda quando chegamos à vida adulta — apenas sofisticamos o jogo. Criamos empresas, disputamos posições, acumulamos ganhos e perdas, distribuímos prêmios e castigos. Mudam os objetos da fantasia, não a sua essência.
Se na vida privada é assim, na pública ainda mais. Os políticos representam papéis de estadistas, patriotas abnegados e defensores da moralidade — personagens cuidadosamente construídos para o palco da opinião pública.
A diferença é que o ator profissional declara-se ator; o político, não.
Ambos emocionam plateias crédulas, mas ao menos, no teatro, todos sabem que é ficção. Já na política, a ilusão veste o disfarce da realidade — e, por isso, engana mais inocentes que qualquer peça dramática.
Interrompa a fantasia de uma criança e ela reage com tristeza: vive a história com corpo e alma e não quer que lhe digam que tudo é um faz de conta.
Interrompa a fantasia de um adulto sobre seu político de estimação e a reação será pior: não apenas tristeza, mas revolta. Em vez de agradecer o alerta, revolta-se contra quem tenta despertá-lo. Apega-se ainda mais ao personagem que o ilude.
É da natureza humana cultivar as ilusões. Gostamos de alimentar os sonhos que nos enganam.
São esses iludidos os que continuam esperando seu Godot político — figura imaginária que nunca chega, mas cuja ausência alimenta uma esperança eterna.
E assim a política se converte no teatro do absurdo em escala nacional, uma brincadeira de adultos que teimam em levar a fantasia até as últimas consequências.
Qual é o sentido da política?
Talvez o mesmo sentido da vida no teatro do absurdo: manter a ilusão em cena pelo maior tempo possível.
São Paulo, 22 de novembro de 2025.
Jorge Wilson Simeira Jacob